O segundo semestre do ano pode ser de ainda mais desafios para o setor primário. Os reflexos da pandemia e do momento econômico, chegam também ao campo, com insumos para o plantio de lavouras mais caros, além da falta de alguns produtos. O dólar alto encarece muitas matérias primas determinantes para a lavoura.
É o caso de componentes de herbicidas, fungicidas e inseticidas, além do próprio adubo, que são importados ou cotados em moeda internacional. A informação é do gerente adjunto da Emater/RS-Ascar Regional, Carlos Augusto Lagemann. Ele ainda aponta a própria logística como um fator de alta nos custos e no desabastecimento. Além de portos e aeroportos fechados por alguns períodos, o que causou falhas no fornecimento, o encarecimento do combustível acaba sendo repassado e eleva o valor do produto final.
O gerente ressalta que o produtor de grãos ainda consegue ser remunerado de acordo com o investimento, já que milho e soja estão com bons preços no mercado, mas aquele agricultor que planta para manter seu plantel de gado leiteiro é quem tende a amargar as maiores perdas. Isto porque o preço final do leite não pode ser ampliado de forma a compensar os custos da produção, pois o poder de compra dos brasileiros caiu muito com a pandemia. Produtores de leite e a indústria, projeta, devem ter a margem de lucro ainda mais reduzida para garantir que o produto tenha um valor acessível ao bolso do brasileiro.
A atividade leiteira tem perdido muitos produtores nos últimos anos, especialmente aqueles com volumes reduzidos. Entre investir para ampliar a produção e assim conseguir manter o negócio rentável ou migrar para outra atividade, muitas famílias têm optado pela segunda opção. Como agravante há o próprio envelhecimento do capital humano na agricultura e, a expansão do negócio, pode não ser viável justamente pela falta de mão de obra. Com isso, cada vez mais a produção de leite vai se concentrando em um número reduzido de produtores, que precisam ter um grande volume de litros para receberem um valor compensatório.
Na visão de Carlos Augusto, a própria estrutura fundiária da região, com propriedades pequenas, impede que as famílias tenham um grande número de vacas leiteiras. Uma das saídas para quem quer ampliar a produção é ter o rebanho confinado, muitas vezes alugando áreas para o plantio do alimento para o gado ou comprando feno e silagem de terceiros. Esta prática também acaba por abrir um nicho de mercado. “Há propriedades que se especializam na produção de feno e silagem para a comercialização”, ressalta, destacando que há poucas propriedades rurais abandonadas. As áreas que favorecem a agricultura em termos de relevo são muito bem-aproveitadas, às vezes com três safras ao ano. A maior dificuldade é nos municípios com morros, onde fica mais difícil o uso de trator.
Um reduzido número de propriedades que deixaram a atividade leiteira migrou para a produção de gado de corte. É uma opção interessante, especialmente para quem já possuía a estrutura para gado, com instalações e equipamentos. Contudo, tendo em vista a alta no preço da carne bovina, este segmento está encontrando dificuldades de encontrar terneiros para a engorda. Esta “dificuldade” pode se transformar numa grande oportunidade, salienta Lagemann, visto que produtores podem se especializar na criação de terneiros para atender a esta demanda.
Integrados
A produção integrada de proteína animal, está sendo fortemente afetada pela alta dos grãos, o que reflete no preço final do produto. A situação é mais delicada na avicultura, especialmente nas indústrias menores, que exportam menos. Algumas integradoras estão optando por ampliar o espaçamento entre o alojamento dos lotes, reduzindo a produção. Há quem considere melhor remunerar o produtor mesmo com o aviário vazio, do que produzir frangos e não poder repassar o valor do custo ao consumidor final, que está com o poder de compra reduzido.
Na suinocultura, a exportação em alta, cotada em dólar, ameniza os prejuízos.
Diversas variantes contribuem para que o setor primário viva um momento diferenciado. A frustração de safra de milho por conta da falta de chuvas, aliada a uma demanda interna maior para atender as exportações de carne – especialmente para a China – são os principais motivos da alta do milho.
Plano Safra 2021/2022
Na segunda-feira, o gerente regional adjunto, observava que era imprescindível as definições em torno do Plano Safra, que acabou sendo lançado no dia seguinte. Considerava que, neste período, os produtores já estão se preparando para o plantio e as incertezas quanto ao Plano Safra, especialmente para a agricultura familiar, pode trazer impactos diretos na lavoura. Como exemplo cita o elevado custo de produção, com insumos sendo adquiridos no auge da demanda e supervalorizados, ou um potencial produtivo menor, com a terra recebendo menos tratamento e adubo, além do uso de sementes mais em conta e com produtividade menor.
Menos renda
Todas essas situações de desafios para o setor primário impõem uma nova realidade. Lagemann destaca que pode haver perda de renda nas propriedades, o que torna o meio rural pouco atrativo para os jovens. Como a região tem uma grande oferta de empregos na indústria, muitos podem se sentir mais atraídos para as áreas urbanas, deixando para trás a atividade rural. Ressalta que por mais que hoje se tenha muita tecnologia no campo, o capital humano ainda é fundamental.
Outro ponto observado pelo gerente é que quanto menor o número de produtores no meio rural, menos alimentos serão produzidos, o que torna o preço mais elevado para o consumidor urbano e traz impactos para o seu dia a dia.