Semana passada acompanhei a discussão de um casal no ponto do ônibus. “Te vi com aquele barbudo de novo. O que ele queria?” Ela, com ares da mais fingida inocência, justificava ser apenas amigo de seu irmão. “Eu percebi teu jeito de olhar. Provocando ele. E aquela blusa que comprei para usar só comigo? Nem terminei de pagar e tu já sai como se todo dia fosse festa. E com outro?” Reclamou o desconfiado namorado. Minutos depois, a senhora sentada a meu lado, cochicha maldosamente: “Essa deve ser tinhosa…” Eu via uma garota mal saída da adolescência – que sensualizava para a comunidade do Tik Tok e outros – a seguir o caminho natural e seletivo da vida. Confesso que torci pelo tal barbudo ser mais esperto do que aquele pobre infeliz.
Dois dias depois, no mesmo ponto de ônibus, quem eu avistei? A garota, a polêmica blusa, e outro rapaz. Sim, era ele: o barbudo! Ignorando todos nós, ela se desmanchava no jogo típico da idade onde hormônios atropelam neurônios. “Te curto muito”, repetia o galã canastrão. Ela excitava-se: “Tu é louco!” Ele sussurrou algo enquanto envolvia a cintura da guria que, se fazendo de indignada rosnou:
“Não sou dessas de baile funk!” O barbudo não perdeu tempo: “Quem disse que eu quero dançar contigo?” Ambos riram maliciosamente e o ônibus arrancou. Com o ruído não ouvi mais nada. Aliás, não ouvimos, pois todos os passageiros daquele horário matinal, já acompanhavam as aventuras amorosas da guria.
No dia seguinte, lá estávamos à espera de mais um capítulo daquela novela urbana. Aprendíamos que portabilidade não é apenas entre tecnologias digitais. E não é que ela chegou com o namorado oficial? Sim, aquele mesmo que gastara seu dinheiro comprando blusinha sexy. Pelo jeito haviam selado a paz. Entre amassos apertados ele perguntava qual seria o presente que ela lhe daria de aniversário.
“Ai amor, tens tudo. Vou pensar em algo que só tu pode ter. E eu, vou ganhar o quê?” Empolgado, mostrou o cartão da loja. De lá viria, quem sabe, mais roupinhas. “Vamos passar o fim de semana na praia. É barato no inverno, já reservei hotel!,” anunciou o moço.
Nós, testemunhas habituais desta história de encontros e desencontros, amor e traição, já suspirávamos conformados, quando percebemos que o abraço dela, bem apertado, no namorado, era mais do que reconhecida gratidão por tão bons presentes.
Do outro lado da rua, o barbudo desviava a rota, alertado por ela que, com as mãozinhas nervosas, o mandava seguir adiante. Quase me bateu pena do pobre e ingênuo namorado. Mas olhando bem no fundo daqueles olhos sem brilho ou personalidade, achei que ele merecia. E que a moça tirasse tudo o que pudesse o quanto antes, porque o tempo é inimigo dos amantes voláteis e fúteis.
Um dia, sua única moeda de troca se manterá empinada a base desses jeans de esperto elastano. À nossa musa do circular, poderá restar o suplício, o castigo de passar o resto da vida ao lado de um manso alegre. Isso se o tal não encontrar outra ave rapineira pelo caminho. A carne é fraca. Especialmente a dos tolos.