Em 22 de agosto é celebrado o Dia do Folclore no país. Uma data que celebra a importância da cultura popular brasileira por meio de representações diversas como personagens, festas, canções, lendas e brincadeiras. É a construção simbólica de significados e sentidos e exaltam a identidade de um povo. Do Norte ao Sul, figuras como o Curupira, Boitatá, Saci Pererê e o Negrinho do Pastoreio ganham destaque ao representar a diversidade e são trabalhados também em sala de aula.
O historiador, professor universitário e da rede municipal de ensino de Arroio do Meio, Sérgio Nunes Lopes, destaca que a data deve ser celebrada por ser algo dinâmico, ou seja, não se reproduz a mesma performance com os mesmos objetivos sempre. “O povo pega uma base do que já existe e pode alterar letras, coreografias e o que bem entender, pois, justamente por ser sabedoria popular, não tem autoria declarada e ninguém pode reivindicar individualmente direitos autorais do que é eminentemente folclórico. Desta perspectiva há ambivalências que demandam atenção. Uma mesma manifestação, literatura ou o que quer que seja, pode ancorar pautas adequadas à sociedade ou ser distorcida para servir de base para discursos inoportunos e até ofensivos. Tendo-se em conta o contexto atual do Rio Grande do Sul, por exemplo, a mobilização do folclore pode impulsionar a reconstrução a partir da recuperação da autoestima que o folclore pode despertar. Por outro lado, as mesmas performances podem trazer à tona preconceitos estruturais arraigados como o machismo, a xenofobia, a homofobia e, sobretudo, o bairrismo.”
Cada região do Brasil atua de uma forma. De acordo com Lopes, a invenção das tradições, como trabalhada pelo historiador Eric Hobsbawm, segue em paralelo ao tipo de discurso e à ordem social defendida por uma média da coletividade que produz as narrativas. No caso do Rio Grande do Sul, há um conjunto de mitos fundadores bastante recentes. “Assim como o neocolonialismo europeu se valeu do romantismo na literatura para justificar ideologicamente algumas decisões políticas, no Estado, a literatura que criou alguns dos personagens folclóricos e também ajudou a inventar a imagem que se tem do gaúcho e do seu arcabouço de representações. Serviram de pano de fundo para isso os conflitos e guerras constantes como a Farroupilha, as Guerras Cisplatinas e a do Paraguai.”
Ele cita um estudioso do tema, Paulo Ricardo Nunes, que desenvolveu dissertação de mestrado sobre o assunto e atribui a Simões Lopes Neto a sistematização das lendas que chegaram contemporaneamente. Lopes Neto cita as lendas do Sul e cria uma subcategoria para as missioneiras. Tem-se, por exemplo, as lendas Mboitatá, A Salamanca do Jarau e O Negrinho do Pastoreio. Já as missioneiras são: A mãe do Ouro, Cerros Bravos, A casa de Mbororé, Zaoris, O Anguera, Mãe Mulita e São Sepé.
SALA DE AULA
De acordo com o professor, falar sobre o Folclore em sala de aula é necessário, pois a abordagem crítica a estes aspectos é muito potente da perspectiva pedagógica. “Um trabalho sério pode ser um bom disparador para que os estudantes questionem algumas verdades cristalizadas e até a raiz de alguns preconceitos.”
PALAVRA
A palavra foi inventada pelo intelectual inglês William John Thoms (1803-1885), para categorizar O que emana do povo e, de certa forma, representa uma coletividade por se estender no tempo. O que Thoms fez foi agrupar duas palavras da língua inglesa: folk = povo e lore = conhecimento, tradição, saber, surgindo assim: folk-lore. Em português se cunhou o termo ‘folclore’, mas seguindo aquela lógica etimológica. Este recurso linguístico se deu em 1846 numa publicação feita na imprensa inglesa. Desta perspectiva se percebe que o folclore é orgânico, ninguém tem autoridade para cria-lo. A adequação do emprego do adjetivo folclórico, ao que quer que seja, só se justifica mediante a participação popular.
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