A maior parte dos erros judiciários ocorre, não porque o Juiz queira julgar errado, fazendo injustiça, mas porque não entendeu corretamente a questão.
Na minha já longa atividade como advogado, principalmente assessorando outros escritórios de advocacia, com ênfase na fase recursal, só aceito uma causa quando convencido de que a decisão do Juiz não é a melhor e que possa fazer alguma coisa em benefício do cliente.
Alguns juízes tem mais facilidade de julgar, especialmente de entender o que os juristas costumar chamar de “nó górdio” da questão. Se o Juiz não entendeu, por óbvio não decidirá corretamente. Rui Barbosa fazia alusão ao erro judiciário, dizendo que o Supremo Tribunal é aquele que erra por último.
A expressão “Nó Górdio” origina-se de antiga lenda da Grécia Antiga. Conta-se que o rei morreu sem deixar herdeiro. O Oráculo anunciou que o sucessor chegaria à cidade num carro de bois. Ao chegar à cidade o camponês Górdio foi coroado. Para não esquecer seu passado humilde, amarrou o carro com um enorme nó a uma coluna. O nó era, na prática, impossível de desatar. Seu filho também não deixou herdeiro. Ouvido novamente, o oráculo declarou que quem desatasse o nó de Górdio dominaria todo o mundo.
Quinhentos anos se passaram até que Alexandre, o Grande, ouviu essa lenda ao passar pela Frígia. Intrigado foi até o templo de Zeus observar o nó. Após muito analisar, desembainhou sua espada e cortou o nó.
O advogado não pode simplesmente cortar o nó. É preciso analisar adequadamente a questão para colocá-la em termos juridicamente corretos e ajuizar a ação adequada. Perder uma ação por erro de escolha só não é pior do que perder um prazo processual.
Já o Juiz, para julgar bem, deve compreender o “x” da questão. Se não apanhar corretamente os fatos e provas só poderá chegar a uma conclusão equivocada.
Quando no Tribunal, em uma determinada sessão de julgamento, discordei de 26 em 52 votos do relator, sendo acompanhado em 25 pelo terceiro colega. No voto que fiquei vencido, quando do julgamento do recurso pelo Grupo, o resultado foi 7 x 1, prevalecendo o meu entendimento. Também já tive caso, como advogado, que 1 x 2 virou 7 x 0 no Grupo quando, finalmente, entenderam corretamente a questão.
Hoje as audiência são gravadas. Anteriormente a testemunha narrava os fatos, o Juiz resumia e ditava para o escrivão. Era importante que fossem usadas as expressões da própria testemunha para não alterar o sentido.
Já vi ser questionada a credibilidade de uma testemunha porque o escrivão policial colocou em seu depoimento, colono simples do interior, que a lesão fora no “frontal” – expressão que o escrivão copiara do laudo.
Outra, que a testemunha mandara a filha ao armazém comprar uma “camisinha”, que o juiz traduziu como “camisa de vênus”, quando se tratava de uma camisinha de lampião.
Em Santa Cruz, o antigo Juiz ficou possesso com a testemunha que, ao perguntar-lhe onde morava, respondeu-lhe que morava “atrás do céu”. Insistindo com a testemunha, essa voltava a repetir a mesma resposta.
Furioso, achando que a testemunha estava desrespeitando o Poder Judiciário, ameaçou-a de prisão se não parasse com aquilo e informasse onde morava. Foi preciso o escrivão intervir para acalmar e esclarecer o magistrado que “Atrás do Céu” situava-se no alto da Rua Ramiro Barcelos. Quem olhava a partir da Catedral, tinha a visão até a colina no horizonte, sendo que “atrás do céu” é que morava a testemunha, região do hoje Corredor Zimmer e Rua Rio de Janeiro.