A turma estava aproveitando o fim da tarde de verão. Uma pergunta animava a mesa: como você passaria o dia, se soubesse que era o último da vida?
Já não era cedo. Havia muitas garrafas vazias. Todos tinham colaborado com os copos e com as risadas, de modo que ficava difícil falar a sério. O mais que se ouviram foram ideias valendo por piadas. Quase todas impublicáveis…
A ressaca passou, mas não me saiu da cabeça a tal pergunta. Aí está. Os filósofos têm razão… Perguntas valem mais do que respostas.
– Pois é, mas sabendo que este seria o último, como passar o dia?
Quantas coisas nos vêm à cabeça!
Difícil não pensar em atos heroicos, do tipo, acertar uma velha encrenca. Tratar de ficar quites. Seja através do mais compungido pedido de desculpas, seja com um soco bem no alvo.
Difícil não pensar em maravilhas como dar cabo de uma garrafa de champanhe que custasse o mesmo que custa uma lambreta. Ou comprar uma lambreta, só pelo prazer de dar uma volta ao redor da quadra. Ah! melhor ainda, dar uma volta de lambreta empunhando a garrafa de champanhe para beber no bico.
Ou fazer coisa mais audaciosa, cinematográfica… pegar um avião e desembarcar em Monte Carlo a tempo de acompanhar o Grande Prêmio de Formula 1 de Mônaco.
Encomendar a comida mais apreciada entre todas e se empanturrar sem medo algum, nem da conta nem do colesterol.
Ou então, finalmente, sanar um lapso do passado. Entrar porta a dentro e cair nos braços do namoradinho da adolescência, não dando a mínima para o espanto de ninguém, nem da mulher nem da sogra nem dos netos. Deixar todos de boca aberta assistindo à cena.
Fazer uma festança com tudo a que uma festa de mil e uma noites dá direito e dançar até cair.
Ou tomar um porre e se meter na cama, para nem ver o fim.
Ou…
Nossa! Dá pra pensar em tantas opções mirabolantes…
Mas se for para falar sério é diferente.
Não sei o que eu faria, se estivesse na situação.
Só sei o que eu desejaria fazer…
Gostaria de sentir que tinha vivido de um modo tão digno e tão completo, a ponto de não fazer nada diferente do que faço no meu cotidiano miudinho. Na companhia de quem eu amo, tomaria um café da manhã bem bom, faria a sesta depois do almoço. E diante de um belo por do sol, talvez com a cuia do chimarrão ou relendo uma página memorável, esperaria que os minutos se esgotassem… e viesse o fim.