Sou de uma época em que as crianças obedeciam cega[1]mente aos pais. Não havia espaço para discussões ou questionamentos. Chamar os mais velhos de “senhor” e “senhora” era parte da educação que recebíamos sem hesitar. Já na adolescência, observar horários era compromisso sagrado. Minutos de atraso levavam à suspensão do direito de sair com os amigos, ir à reunião dançante, jogar futebol e até frequentar a casa dos vizinhos. O código de comportamento era rígido, inegociável, onipresente em todos os ambientes de convivência. Comparado aos tempos atuais vivíamos em espécie de uma ditadura familiar. Não era fácil transitar entre a rebeldia típica da “juventude” com o respeito obrigatório com os mais velhos. Para alcançar a sonhada liberdade obedecíamos a diversos ritos de passagem. Havia pressa para completar 18 anos e trabalhar com carteira assinada. Isso permitia ganhar o próprio dinheiro para bancar o ingresso da boate, um par de chuteiras novas, uma camisa da moda ou uma carteira de cigarro. Fumar era um hábito natural do chamado “salto para a maioridade”. Respeito e medo forjaram minha geração, nascida em 1960. Flertar com voos-solo convivia com o respeito ensina[1]do desde o berço. Com o tempo, porém, passei a entender o que levava os pais a adotarem tamanha severidade. Eram outros tempos, diferentes, de pouca informação para regrar a criação dos filhos, de diálogo restrito.
Nasci na colônia, longe do centro urbano onde meus colegas de aula usufruíam de hábitos muito diferentes. Eles viam tv todos os dias, andavam de carro e usavam roupas compradas em lojas. Até a adolescência, minha mãe e avó costuravam minhas camisas e calças de brim em máquina com pedal. Camisetas eram luxo concedidos pelos meus padrinhos que moravam em cidades grandes e que me presenteavam no aniversário ou Natal. Apesar das agruras, tive filhos e fui compreendendo o comportamento adotado pelo seu Gilberto e pela dona Gerti. Mas admito ter amigos e parentes que até hoje não perdoam os pais por tamanha dureza na criação dos filhos, somada à falta de liberdade e desconfiança permanente. Hoje vejo – e lamento profundamente – o extremo oposto desta minha época de rigidez extrema. O que enxergo são pais omissos que criam seus filhos sem limites. Crescem, mas sem valores e princípios, resultado da liberdade absoluta permitida sem responsabilidades ou obrigações. Confesso meu temor diante das futuras gerações. São eles que comandarão o nosso Estado e o país. O que se pode esperar?