Tudo começou com o povo hindu. Eles acreditavam que um anel simbolizava o amor. A mulher do Ronaldo descobriu isso em uma dessas revistas femininas e exigiu sua aliança. Estavam juntos há mais de seis anos e dizia sentir falta desse atestado visual de compromisso. Ele contra argumentou que era um hábito antigo e fora de moda. “Coisa brega, meu amor”, justificou. Depois, ao conferir o preço de alianças e anéis percebeu que, ainda por cima, era bem caro. “Em plena crise ela me vem com essa conversa”, reclamou.
Lembrei que antigamente, mas muito remotamente as argolas nos dedos, fossem caras ou acessíveis, eram uma espécie de certificado de propriedade da mulher. “Essa está fora do mercado. Machos avulsos, por favor, vão procurar sua turma.” Com o tempo, o sentido machista suavizou para algo menos rude e mais próximo ao que hoje acreditamos simbolizar, como parceria amorosa e fidelidade. Assim Ronaldo, como todo bom marido, amoleceu o coração e decidiu comprar a tal aliança.
É a partir daí que chegamos ao ponto fundamental deste artigo. Para economizar, Ronaldo foi a um ourives amigo dele, na zona norte de Porto Alegre, que confeccionaria as alianças com um preço bem menos salgado e ainda parcelaria. Como não costumava circular muito por essa região de Porto Alegre, acabou perdendo-se nas ruas que desconhecia. Foi bem na esquina da Avenida Assis Brasil, com a rua Arroio do Meio, vejam só, que deparou-se com a mais inesperada das cenas.
A noiva-esposa saltara de uma lotação, com uma saia curtíssima que ele jamais vira, direto para os braços de um sujeito, que ele também desconhecia. O beijo apaixonado, o abraço apertado e a corrida deles até o carro deste sujeito, que sumiu no trânsito alucinado, apenas demonstravam que boa coisa, pelo menos para ele, não sairia daquele encontro. Por uma dessas coisas do destino, Ricardo, antes dessa cena, fotografava a placa da rua para me enviar como sugestão de citação nesta coluna.
As imagens renderam muito mais do que um comentário sobre o reconhecimento da Capital à pujança do Vale do Taquari. “Economizei dinheiro e me livrei de uma mulher infiel”. Ela justificou o ato reclamando que ela a deixava solta, não mostrava compromisso e que a aliança de casamento devidamente colocada no quarto dedo da mão esquerda, onde passava a “veia do amor”, ligada ao coração evitaria deslizes como este. A mais esfarrapada desculpa de todos os tempos!
Qual veia não tem relação com o coração? Talvez aquela, imaginária, que levou a moça a desejar uma aliança, talvez para usar como fetiche, nos encontros como o namorado que mantinha há cerca de um ano. De qualquer maneira, acho que a lição foi bem aprendida e assimilada pelos dois.
Se ele foi um cara frouxo, que seja mais presente a partir de agora. Se ela queria um símbolo da união, que iniciasse por respeitar a regra básica das relações à moda antiga, que é não trair, que evita até castigos implacáveis. O marido contrariado em busca de uma aliança depara-se com o maior de todos os motivos para desfazer qualquer aliança romântica.
Ricardo me garante que a partir de agora, não quer mais aliança, nem uniões estáveis, tão sujeitas a intempéries como a vivida. Eu sei que esta decisão radical não passará de um ou dois meses. Homens e mulheres, por pior que tenha sido a experiência a dois, após a cicatrização da ferida, partem para novos romances. Amar é bom. Com ou sem anéis. O compromisso afinal, não se expõe em dedos, mas em atitudes. Essas valem ouro.

