“É melhor para nós ficarmos distantes. Vermos-nos eventualmente como bons amantes. Separados, ficaremos só pelo Cep e o endereço. Mas, estaremos perto, pela paixão, pelo nosso apreço. À distância, seguiremos apaixonados, certos que é o melhor para o nosso amor de futuro incerto. A distância nos deixará com saudades daqueles lampejos de felicidade, mas apagará aquela rotina de infelicidade. Então, mesmo em domicílios diferentes, não existirão empecilhos para o amor que a gente sente. Mas, para manter o nosso fogo ardente, a distância é o melhor remédio ainda existente…”
Os versos singelos foram escritos por um colega, o jornalista Sidney de Jesus, sobre o tema que nunca se esgota que é a vida a dois. Dividir o mesmo teto sufoca? Viver em casas separadas liberta e evita o tédio? O poema acima carrega um ideal de rimas e métricas tão livres quanto deve ser o relacionamento proposto. Mas viver em “lampejos de felicidade” será a solução mais apropriada? Um sujeito livre, maduro e independente decide assumir uma relação moderna. Ela quer ar, tempo para livros, amigos e familiares. O tempo passará e a energia da paixão permanecerá acesa?
Ligará a amada em uma terça-feira, por exemplo. “Vem, querido te preciso tanto…” É o efeito carência-por-distância. Será uma maravilha na fase inicial. Depois, a bronca no trabalho, o trânsito maluco, o perigo de assaltos, e frio a chuva ou o calor, escassearão as visitas. E não existe tele- entrega que resolva o problema. Aliás, até pode existir, mas aí começa um novo problema. E os finais de semana? Um cinema? Legal!
Mas ela quer ver aquele filme-arte iraquiano que tem como atores principais dois camelos e algumas tempestades de areia. E lá se vai a chance dele assistir Batman contra Superman. Ao sair do cinema, engasgados de tanto pó e panorâmicas congelas irão a um bar intelectualizado ouvir um recital de poemas épicos em gaélico. “Na minha ou na sua casa?” Perguntará ele após o programa culturalmente correto. Início de madrugada e tomam finalmente o rumo do apartamento dele.
Ao sair do banheiro, ela reclama. “Tu acerta tudo em volta, menos o vaso,”, referindo à pontaria do namorado. Acrescenta que está com muito sono. Quer dormir “abraçadinha”. Ele, estressado, abre uma garrafa de vinho e lá vem ela, com outro comentário. “Tens bebido muito. No mínimo tem outra te visitando”, insinua. Não há alternativa a não ser abraçar a amada e, com a paciência de um monge, diz exatamente o que ela quer ouvir.
“Tu és a única. Que bobagem! Descansa, sei que tens trabalhado muito. Vou limpar o banheiro e já te acompanho”. E lá está ele, mestre da psicologia barata torcendo vê-la dormir para acordar agradecida e mais disposta a aplacar a tensão que rasga a paciência. No domingo, logo após o almoço, ela retornará a seu cantinho bem decorado e cheiroso. E ambos darão graças a Deus pela solidão. Toda relação chata, precisa de um tempo.

