Os versos da poetiza mineira Adélia Prado, tão antigos que nem data tem, alertam: “O amor quer abraçar e não pode. A multidão em volta, com seus olhos cediços, põe caco de vidro no muro para o amor desistir”. Tudo a nossa volta conspira contra o amor. Tudo é só egoísmo, fatalidades vivas, crises odiosas. A vida nos deprime. É isso! Está tudo cheio de cacos cortantes. Em tempos onde a poesia está à margem, nos restam comerciais bacanas que nos vendem algum produto e amores ideais.
É tudo comercial mesmo, diria a namorada de um sujeito – empresário, político ou escroque de outros gêneros – enfim gente que vive de propinas. É tudo uma dança sem par, diria o desiludido das relações estáveis, do tipo mandar flor, namorar, casar e criar filhos ou árvores.
De qualquer maneira, é um par na dança da vida, que bem ou mal nos conduza, ou nos ajude a conduzir, é o que todos buscam. Os erros, os descompassos, as falhas de caráter ou se resolvem, ou se adaptam às circunstâncias. Casais se formam assim. Aqueles que dão certo é porque tem muito em comum. Não me venham com essa de opostos que se atraem. No fundo se assemelham.
O que eu tenho é o que mais se aproxima de meu íntimo. Para bem e para o mal. O importante é nunca desistir – dar um jeito de pular o caco de vidro. Quem sabe o melhor não seja derrubar o muro? Mas quem se atreve a tomar tal iniciativa? Em tempos de tanta violência física e emocional, abrir-se pode ser um risco.
“Amar é um deserto e seus temores. Vida que vai na sela dessas dores”, é sempre assim. Amar não exige teste de caráter, aptidão. Basta um olhar, uma dissemelhança superada por um toque. Amar um bandido? Uma falsária. Que te trairá com o chefe energúmeno? Te deixará uma mensagem no espelho escrita com batom barato? Te bloqueará no whatsapp?
O medo, o pensar demais exclui possibilidades de felicidade. Agir apenas movido por uma súbita paixão é rima pobre da intuição – essa sim deveria ser levada em conta. Sempre! É preciso aprender a utilizá-la para que ela te leve aonde for melhor, disse John Lennon (intuí que precisaria escrever este artigo com ajuda de bons pensadores e poetas).
Então o que você está fazendo aí, abaixo de mau tempo, cercado de notícias de corrupção, de tanta violência gratuita? Entrou em crise também? Todos brasileiros sensatos vivem a crise. Mas viver no pragmatismo é como ler uma partitura musical sem colocar seu estilo de ser – ou para voltar ao exemplo da dança – como ser mestre no bailado, sem criar um novo passo.
Abrir o coração e dizer para alguém que tudo tem mais vida com ele ou ela, é muito melhor. Vamos lá, quem sabe um mimo neste domingo? Uma rosa, um perfume, um cartão ou uma ceia especial. Se bateu aquela intuição e ela disse para ir em frente, derrube o muro.
Nada de intimidar-se com as ameaças de cacos cortantes. A dor de todo grande amor, será sempre muito menor do que a tristeza de nenhum amor. E ainda podem render alguns poemas singelos, leves, com sabor de beijo, de carícia, de suspiro que arrepia a nuca. Um feliz Dia dos Namorados.

