De vez em quando penso no contingente de pessoas desconhecidas que habitam o nosso cotidiano sem que nos demos conta disso. Todos os dias, ao despertar, recolho os jornais do dia dispostos diante da porta de casa. Imagino quem (e quantos) são os entregadores que me trazem o mundo em dezenas de páginas ao alcance da minha mão. A própria erva-mate, sorvida no mate amargo habitual, é resultado da dedicação de muitas mãos que jamais serão vislumbradas.
A vida é uma obra conjunta, embora poucas pessoas reconheçam a importância “dos outros”, estes desconhecidos que habitam e viabilizam a nossa rotina. Lamentavelmente a egolatria, a cultura do egoísmo e a falta de solidariedade marcam este tempo que mistura ainda o consumismo exacerbado. As virtudes humanas – sejam quais forem! – somente possuem valor quando passam pela metamorfose possível de fomentar o bem comum, alicerce de melhoria da vida de todos nós.
O dia a dia está repleto de maus exemplos em que alcançar os objetivos a qualquer custo significam sucesso ou fracasso nas 24 horas do dia. Quando temos filhos, o exemplo vale ouro diante dos inúmeros exemplos que possamos citar a eles. Condenar o uso do álcool associado à direção, por exemplo, tem o valor diluído quando bebemos e, na madrugada, saímos de casa para buscar nossos adolescentes nas baladas onde a bebida dita o ritmo dos embalos.
A falta de educação dos humanos nos faz amar cada vez mais os nossos animais de estimação
O grande desafio para nós, pais, responsáveis e educadores, é o perfeito equilíbrio entre o respeito às regras sociais e a postura de “babaca”, do tipo que respeita a fila enquanto todos furam a ordem de chegada. É um exercício desgastante no qual a coerência é o limite a ser observado.
Viver em sociedade é aprender a ceder, renunciar. Esta capacidade nasce e se desenvolve dentro de casa, pouco depois na escola, mais tarde na faculdade, simultaneamente no condomínio, cotidianamente no bairro, no ambiente de trabalho e na vida social em geral. Comer e beber com amigos, sair mais cedo do restaurante e deixar míseros 10 reais para o garçom não constitui procedimento condizente da boa prática da vida em sociedade.
Apesar do amplo conhecimento das regras de etiqueta “da vida como ela é”, proliferam exemplos de “como não proceder” em todos os lugares. Muitas vezes somos invadidos pela revolta por bancarmos o “Joãozinho do passo certo” e pela vontade de mandar às favas todos os ensinamentos ministrados à gurizada lá de casa.
Frear impulsos, refletir e refazer a rota é do jogo. Faz de nós seres humanos diferenciados dos animais irracionais. Infelizmente, contudo, a cada dia, apreciamos nossos cães e gatos. Fiéis, eles são respeitadores das regras e dignos do amor que lhes dedicamos.