Ana Paula Nunes, Campo, 37 anos, moradora de Florianópolis (SC) certamente passou pelo maior teste de sua vida esta semana. Na última segunda-feira, ela chamou a polícia para prender o filho, de 21 anos. A reação da faxineira catarinense foi resultado do espanto ao ver o filho chegar em casa carregando mais de cem anéis, correntes, pulseiras, bonés de grife, carteiras, óculos, camisetas e cuecas, bem como uma caixa de som, um notebook e um aparelho de DVD. Além disso, ele pedira ajuda para comercializar os objetos.
A notícia, veiculada na edição da última terça-feira da Zero Hora, não saiu da minha cabeça durante todo o dia. Eram 6h quando li pela primeira vez a informação, mas reli diversas vezes até a noite. Segundo Ana Paula, o filho – usuário de maconha – trabalhava como servente de pedreiro e não morava com ela, que está desempregada. Para completar, o gatuno confessou que queria presentear uma ex-namorada com as joias.
Tento imaginar o dilema vivido pela serviçal que certamente lutou com dificuldades para criar os três filhos ao lado do marido. Certamente ela repetiu milhares de vezes aqueles conselhos surrados numa catilinária infindável para todos que têm filhos: “Meu filho, seja honesto, não minta, não engane as pessoas, trabalhe, sustente sua família e ame seus filhos”. Mas o que fazer ao deparar com alguém, sangue do seu sangue, que chega em casa carregado de objetos furtados?
É justo mandar prender o próprio filho num país onde apropriar-se de bens públicos virou esporte nacional?
A reação imediata certamente é mandar devolver. Mas como fazê-lo? Diante do impasse, uma nova pergunta se impõe:
– Devo entregar o próprio fruto do meu ventre ou dar-lhe uma lição para que aprenda de uma vez a obrigação de ser honesto?
Sou pai de dois filhos e com frequência enfrento dilemas semelhantes. A hipocrisia das pessoas, as injustiças do mundo e as desigualdades revoltantes num país onde as leis mais parecem objetos de decoração do cotidiano nos desafiam diariamente. Causa hesitação e permanentes dilemas a estafante tarefa de obrigar os filhos a seguir regras, entrar na fila e esperar a vez, além de fazer da honestidade um mandamento inflexível enquanto milhares de conterrâneos driblam a ordem estabelecida e se dão bem.
Por que chamar a polícia para prender o próprio filho num Brasil onde apropriar-se de bens públicos tornou-se um esporte nacional? Bancar o “joãozinho-do-passo-certo” será suficiente, vai melhorar o mundo ou espalhar bem-estar entre os brasileiros necessitados?
A faxineira Ana Paula Nunes não titubeou diante de tamanhos dilemas. Agiu de acordo com a sua consciência e pode dormir sem dificuldades, apesar da óbvia revolta, tristeza e decepção que embalou seus sonhos. Apesar de elogiável, a atitude tem um custo emocional inominável.
Você, prezado leitor, o que faria ao chegar em casa e encontrar a sala repleta de objetos que jamais poderiam ter sido comprados com o dinheiro do trabalho de seu filho?