O Brasil é realmente um país de oportunidades. Despertei para essa característica há pouco. Deixem-me explicar. No exato momento que redijo estas mal traçadas linhas é terça-feira, Dia dos Namorados, quase 17h de uma tarde ensolarada e bem mais palatável que o frio implacável da semana passada. Minha atenção está voltada para a telinha da televisão, sintonizada no canal Globo News. É ali que o governador de Goiás Marconi Perillo presta depoimento na CPI do Cachoeira.
Desde às 10h o assunto monopoliza as atenções do país. Jornalistas de todos os quadrantes acorreram a Brasília para acompanhar a sessão da comissão. Conversa vai, conversa vem, escaramuças aqui e acolá até que surge diante do microfone nada mais que o rejuvenescido senador Fernando Collor de Mello!
Eu e meus colegas de sala, contemporâneos de jornalismo, tivemos a mesma reação ao vislumbrar o semblante do outrora famoso Caçador de Marajás: “Meu Deus!”, dizemos a uma só voz, mais parecendo um bem ensaiado jogral escolar em plena Semana da Pátria.
Escorraçado do poder, expulso de Brasília ao lado da mulher Rosane numa imagem emblemática do combate à corrupção, apeado da Presidência da República pela força da opinião pública (leia-se a revista Veja), o posudo homem das Alagoas se transformou no guardião da moral, defensor dos bons costumes e parlamentar extremamente preocupado com os rumos da ética brasileira.
Os “salvadores da pátria” são sempre uma ameaça concreta à democracia
A democracia, esta filha que precisa de tanto carinho, acalento, afeto e cuidados permanentes, tem destas coisas. Costumo lembrar aos amigos que odeiam a política por causa da corrupção que vereadores, prefeitos, deputados (estaduais e federais), senadores, governadores e presidentes da República não brotam do chão ou surgem diante da nossa porta dentro de um cesto. Todos eles são eleitos por milhares (às vezes milhões) de pessoas que saem de casa de título eleitoral em punho para fazer a sua escolha, livre do cabresto dos coronéis e das oligarquias que reinaram absolutas por séculos em nosso país.
Esta mesma democracia que transformou Collor no rei do marketing político a cada final de semana ofereceu instrumentos para viabilizar a destituição de Collor sem um tiro, golpe ou fechamento do parlamento. Lamentavelmente por um destes caprichos do destino ele foi o primeiro presidente da República eleito pelo voto livre depois dos longos e amargos anos da ditadura que envergonha os brasileiros.
Collor, ascensão pelo voto e queda via impeachment, deve nos fazer pensar, ao invés de suscitar apenas revolta. Daqui a quatro meses teremos uma nova chance de confirmar nossas preferências políticas ou puxar o tapete daqueles que nos enganaram com palavras de efeito, slogans bem pensados ou frases de efeito.
A eleição de outubro envolve a coisa mais importante do cidadão: o futuro da nossa comunidade, da cidade onde nascemos, vivemos, trabalhamos, formamos família e patrimônio. E onde morremos para legar nossos valores e princípios. Por isso, olhos bem abertos e aguçados para separar vigaristas travestidos de justiceiros. Os salvadores da pátria são sempre um grande risco à democracia!