Escrevo esta coluna com antecedência, no domingo de manhã, sem saber, portanto, em que pé andam as manifestações de rua, estas que vem acontecendo no Brasil, de sul a norte. Como, aliás, também sucede em outros países.
Do que vi até agora, tendo a pensar que a coisa pode ser mais séria do que à primeira vista podia parecer.
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Manuel Castells, um estudioso desse fenômeno, tem dito que as manifestações resultam da indignação. Em determinado momento, a população percebe que o governo não a representa e de que as medidas que toma não trazem benefício para população. Beneficiam, isto sim, os grupos que estão próximos do poder. A última gota, aquela que faz transbordar o copo, pode ser o aumento de passagens de ônibus ou outra coisa. Na Turquia, por exemplo, foi o corte de árvores na praça. A internet e sua capacidade de convocar as pessoas para a rua faz o resto.
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Pensando bem, no Brasil temos sobrados motivos de indignação. É de admirar, até, que a coisa não tenha explodido antes.
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Estamos indignados, sim, com a corrupção que aparece por todo lado e que acaba ficando por isso mesmo. Devolver, ninguém devolve o dinheiro que roubou – que eu saiba. Cadeia não existe pra doutor, a não ser por uns diazinhos, o tempo de tirar foto e posar de vítima.
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Estamos indignados, sim, com a prática de nomear ministros e secretários de governo por força de conchavos, sem dar a mínima para a capacidade que o cara tem de melhorar a nossa vida. Competência e compromisso não são coisas que se esperam deles. O senhor ministro ou secretário ganha o posto para ter uma vitrina. Ali ele pode garantir votos para a próxima rodada. E, quem sabe, ensacar um dinheirinho útil para a próxima campanha.
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Estamos indignados com a quantidade de impostos que pagamos. E cadê a aplicação desses impostos nas estradas de que precisamos tanto, em hospitais, em segurança, nas escolas? Onde vai parar a dinheirama dos impostos?
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Estamos indignados com a burocracia que atravanca a nossa vida. Com a justiça que não anda. Para cada passo que queremos dar é uma romaria de papéis, carimbos, prazos, taxas.
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Eu não gosto de briga, deus-o-livre. Dou um boi pra não entrar. Mas talvez seja esta a hora de perder uma boiada, antes de desistir da luta. Perder uma boiada, mas, enfim, garantir alguns avanços para a pátria amada, salve, salve.