“O sertão vai virar mar” é parte de uma profecia feita por Antônio Conselheiro, o homem que liderou em Canudos, interiorzão da Bahia, a criação de uma comunidade de homens livres. Isso se deu lá pelos fins do século XIX. Na história do Brasil, o fato é conhecido como a Guerra de Canudos, uma vez que o arraial foi arrasado após sucessivas batalhas com o exército imperial.
Sem entrar nos detalhes do caso, o fato é que me lembrei da expressão de Antônio Conselheiro – “o sertão vai virar mar”- enquanto assistia ao show de Gilberto Gil e da OSPA, na inauguração do Centro Cultural da Univates, no dia 3 de maio último.
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O novo Centro Cultural da Univates é uma glória. Tem tudo o que os melhores centros culturais do mundo têm em termos de instalações. É incomparavelmente melhor do que qualquer espaço que nossa região já teve ou no momento tem disponível para a realização de eventos. O sertão virou mar.
Agora já é possível sediar aqui espetáculos de primeira linha, sem ficar rezando para a chuva, o vento, o frio, o calor, etc. não estragarem a festa na última hora. O sertão virou mar. Agora o espectador já pode se acomodar civilizadamente num assento previamente reservado e acompanhar o palco sem arranjar um torcicolo. Definitivamente, o sertão virou mar.
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O Centro Cultural da Univates conta com estrutura adequada para receber artistas de nome internacional, como foi o caso de Gilberto Gil, e espetáculos de um calibre a que estamos pouco acostumados: balês, óperas, peças do melhor teatro, etc. Tudo isto ao preço que custam as coisas melhores, claro.
Eu disse acima que o Centro Cultural da Univates tem tudo.
Não tem.
E aqui é que são elas.
Uma casa de espetáculos vive pela vibração dos seus frequentadores. Isto significa que o desafio de dar vida às paredes do Centro Cultural é enorme. Todo mundo sabe que a gente só gosta do que já gosta (ao menos como regra geral). E as experiências que são possíveis no novo Centro Cultural talvez venham a ter um sabor raro, às vezes desconcertante. Acontece que Arte com letra maiúscula não rima estritamente com diversão. Arte tem a ver com estranhamento – além, ou como parte, do prazer que proporciona.
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Ou seja, para o sertão virar mar de fato, será preciso contar com a participação de todos os que querem que isto aconteça.
Se a gente facilitar, vira e mexe, pode se dar o inverso e o mar acabar virando novamente sertão…