Cada vez que vejo propaganda com o último grito em aparelhos de TV, ai-ai, chega a bater uma pontada de agonia. Acontece que a turma que nasceu antes que a TV se tornasse mobília obrigatória não vai nunca achar jeito de explicar como era no começo.
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Me diga aí, você, por favor me diga como explicar que a gente via mais chuvisco do que imagens nas antigas telas preto e branco? Como explicar que enxergar vultos já era uma glória e que ninguém precisava ver detalhes e contornos definidos? E muito menos em cores! Quem precisava de TV em cores? Ainda mais se existiam umas certas lâminas de papel ou plástico para colocar em frente à tela? As lâminas tinham faixas coloridas que filtravam a imagem, dando-lhe alguma cor. Coisa preciosa! Numa certa faixa tudo aparecia em rosa, na outra em laranja, na outra em azul. Quem queria luxo maior? Como explicar, isso sim, como explicar o desespero para fazer retornar a imagem quando ela misteriosamente desaparecia em baixo de chuvisco torrencial e bem na hora H – no melhor do Ringue 12 ou quando o Rim-tim-tim estava prestes a chegar com a cavalaria?
Como explicar que só tínhamos dois canais, que transmitiam em horários limitados e que isso representava uma fartura imensa?
Como explicar que era impossível cogitar a invenção do controle remoto? Controle remoto para quê, se a gente podia trocar de canal girando um botão pra cá e pra lá? Verdade que era um botão custoso de girar. Mas um botão que fazia tac – tac – tac – e operava o milagre de nos levar de um mundo para o outro, quero dizer, de um canal ao outro.
Como explicar que com a mudança de canal era preciso também mudar a antena? Ou seja, tinha de trocar a posição de uma chave pregada na parede mais próxima do aparelho, por onde corriam os fios que vinham diretamente da imponente antena instalada no telhado. Um canal requeria chave voltada para cima; o outro, a chave para baixo.
Como explicar que os anúncios comerciais eram feitos ali na hora e que às vezes a “garota-propaganda” se enganava ou ou alguma coisa dava errado, como no comercial do sofá-cama em que o móvel não funcionou nem com a ajuda de todo o pessoal dos bastidores – tudo isso ao vivo?
Como explicar que em casa onde havia TV – raras e afortunadas casas! – a sala de visitas se transformava em auditório? Cadeiras enfileiradas de ponta a ponta serviam para acomodar uma vizinhança perigosamente entusiasmada, sem nenhuma disposição para ir dormir. Como explicar a ginástica que os donos da casa tinham de fazer para incentivar a debandada do distinto público?
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Melhor não explicar coisa nenhuma. Quem acreditaria nas histórias do tempo da TV à lenha?