Escrevo estas mal traçadas linhas na manhã da última terça-feira, 6 de janeiro, Dia de Reis. Entre tantas praxes consagradas pelos costumes, lembro que se trata do dia de desmontar o pinheirinho de Natal. Também é a data a partir da qual recebíamos cantores com violão, acordeão e gaitas de boca. O terno de reis é uma tradição que poderia soar estranha para as pessoas de origem germânica, mas que no Vale do Taquari se consolidou nas décadas de 60 e 70.
Eu morava no bairro Bela Vista – onde nasci, há 54 anos – e costumávamos juntar uma gurizada da vizinhança além dos primos Daniel, Carmem e Lúcia Schnorr – filhos do saudoso Elemar e da querida Hilda – que residiam nas proximidades. Sem tocar instrumento algum, “arranhávamos” um violão. Eu arrastava um acordeão no qual aprendi a tocar – anos mais tarde – com aulas ministradas pelo falecido professor Harry Lopes, do Instituto Musical Mascarenhas.
Saímos da casa à tardinha para encontrar as pessoas recém-saídas do trabalho. Bem humorados, os vizinhos nos davam biscoitos, chocolates e refrigerante, luxo restrito aos almoços de final de semana. A gente se divertia, copiando o terno de reis que inúmeros grupos de adultos formavam nesta época. Hoje acredito que nos enchiam de guloseimas para que parássemos com aquele verdadeiro festival de uivos de lobo…
Em Lajeado, meus tios Ivo e Ledi Scherer, juntamente com Gastão Valandro e esposa, e vários outros casais iam para visitar amigos. Usavam vários instrumentos como violões, vozes afinadas e músicas bem ensaiadas, num baita show que atraía a atenção dos nossos vizinhos. Detalhe: o grupo chegava depois da meia-noite, como rezava a tradição, mas nos avisavam antes para que ficássemos acordados com a despensa reforçada com cerveja, salgadinhos e salamito.
O grupo formado pelos meus tios e amigos transformou a tradição num show musical!
Todos se conheciam, se visitavam, conversavam na frente de casa com portas e janelas abertas, acomodados em cadeiras preguiçosas. Época diferente da violência da atualidade. Período onde a solidariedade brotava espontaneamente, sem a necessidade de realizar campanhas e de apelos de final de ano para tocar os corações.
Comentei com meus filhos – já adultos – da tradição do terno de reis. Até ensaiei cantar trechos que guardo na memória. A partir da minha narrativa ficaram curiosos, fizeram várias perguntas e se encantaram com os detalhes, principalmente sobre a parceria com os primos, amigos e vizinhos que percorriam conosco – comigo e com a minha irmã, Neusa – o bairro numa cantoria desafinada, alegre, inocente.
Desculpem a nostalgia, mas é começo de ano. As boas lembranças serão, sempre, estímulo para vencer os desafios deste 2015 que chegou e ainda está “fresquinho”. Cheio de promessas, oportunidades e possibilidades para alcançar a felicidade. Ou, ao menos, momentos de alegria, confraternização e reencontro. É o que desejo a todos vocês que me honram com sua leitura a cada edição. Um afetuoso à amiga, colega do Colégio São Miguel e leitora assídua Maria Inês Heineck. Faça contato!