(Para fazer companhia à exposição de ovelhinhas da Claudia Jung)
Ovelhas são brancas e tímidas. Talvez parecessem coelhos, se os coelhos não fossem tão bruscos como sabemos que são. Talvez as ovelhas lembrassem as pombas, se as pombas não abalassem ao simples gesto da mão.
Ovelhas são animais inocentes. As ovelhas confiam, são dóceis. Por isso mesmo, tornam-se presa de todo tipo de lobo. Não admira que as ovelhas tenham aprendido a andar em rebanho. O ajuntamento é capaz de proteger os filhotes. Há oportunistas que rondam. Sempre há raposas por perto.
Ovelhas são simples. Elas carecem de adornos. A utilidade se sobrepõe aos demais atributos. O leite, a lã, a carne, o couro. É por isso que vem de tempos remotos esse afã para organizar as fazendas, programar as tosquias, arrancar o seu couro, arrebatar o seu leite. Aplicar em ovelhas sempre produz rendimentos.
Ovelhas esperam e olham. Não enxergam muitos metros ao longe, porém. Ovelhas não veem mais do que uns trinta passos adiante e nem parece que seja preciso. Elas acompanham umas às outras no ritmo em que anda o pastor. As ovelhas aderem ao guia. Seguem quem as conduz. E vão aonde se espera que vão.
Ovelhas não rosnam, não latem, não uivam, não bufam, não bramam, não guincham, não urram, não picam, não voam, não apontam as garras, não lançam veneno, não armam o bote, não sangram a presa.
Ovelhas apenas arriscam balir.
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A gente nem conhece bem a razão, mas que as ovelhas perturbam é um fato. O estar aí das ovelhas é mais que inquietante. Como é que as ovelhas pastam assim sossegadas, enquanto a boca do tempo tritura e devora?
A confusão que produzem é igual, esteja uma ovelha sozinha, haja algumas ovelhas esparsas, mães com filhotes ou mesmo, um rebanho completo. A docilidade visível aumenta a impressão que se tem. É um mix de ternura e temor.
Por um lado, cresce a vontade de afagar o animal que se expõe e confia. Queríamos que o mundo fosse feito de ovelhas somente. De outro lado, vem o arrepio, pois o rebanho caminha no brete. Vai na direção do redil, da tosquia, do abate. Não existe desvio.
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Quem sonhava inventar uma estrada, quem queria um destino insubmisso contempla as ovelhas com quase agonia. É como olhar-se no espelho. De um jeito ou de outro, marchamos também. Vamos no passo da vida que vai e que vai sem clemência. Não há direção para ir, a não ser para diante. Rebanho que leva, que força, que empurra, que chega.
Sabemos aonde.