“Nasci para o quê?” é o título da obra que contempla a autobiografia de Roque Lopes. Peguei o livro de curiosa, só para dar uma olhada antes de dormir.
Que esperança! A leitura é absolutamente cativante. Não pude parar até vencer as 168 páginas, do cabo ao rabo. Impossível fechar o livro antes do fim. Simplesmente, impossível.
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Roque Lopes fala da infância em Cruzeiro do Sul – as brincadeiras na rua, os banhos no Taquari, a escola, o futebol com os amigos. Passa pelo período como jogador do Lajeadense, pelo casamento, pelo nascimento dos quatro filhos queridos e pelas sucessivas atividades profissionais.
Seria uma história de vida mais ou menos comum, não fosse o fato de Roque Lopes relatar a forma como o álcool foi ganhando terreno no seu cotidiano. A bebida dava coragem para fazer um discurso. A bebida o deixava mais desinibido nas festas e menos tenso face os desafios do trabalho. Por uma ou por outra razão, as oportunidades para beber se multiplicavam. Fez várias tentativas de parar. O começo de uma recaída é contado assim:
“Nos fins de semana, um aperitivo em casa, um pouquinho antes da janta. A seguir, nos domingos ao meio-dia, moderadamente… Meses depois, todas as noites antes do jantar, mas só em casa… Ao meio-dia, só quando estava viajando… Um fora de casa e um em casa antes da janta… Um fora de casa ao meio-dia… Dois fora de casa ao meio-dia e dois fora de casa à noitinha, com direito àquele “unzinho” em casa, que já era um direito adquirido. Em menos de um ano chegava para o almoço às 13h e para a janta por volta das 20h30…”
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Em 5 de janeiro de 1981 começa a virada. É aí que Roque Lopes se interna na Clínica Pinel, em Porto Alegre.
Ao voltar para Lajeado, ainda na estrada, o pai lhe pergunta como vai agir ao encontrar os conhecidos. Roque Lopes pensa um pouco, depois responde: “Vou abrir o jogo. Vou contar tudo para todos. Que sou um alcoolista; que estou em recuperação; que minha doença não tem cura. E que preciso da ajuda e da compreensão de todos.”
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Roque Lopes teve a ajuda e a compreensão de todos. Tanto mais, quando botou na cabeça que podia ajudar outros a se recuperar também. Nessa altura conta como liderou a criação da Central – centro regional de tratamento e recuperação do alcoolismo, com sede em Lajeado e ativa até hoje.
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O que encanta mais no livro de Roque Lopes é a simplicidade como vai contando sua degradação ao longo dos anos e, depois, o esforço e o sucesso na criação de um espaço de tratamento em Lajeado.
Roque Lopes até poderia aproveitar o livro para se prosear. Teria razões suficientes. Mas ele não faz nada disso. Fala de um jeito modesto, simpático, em que não faltam tiradas de humor.
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Se você fizer como eu e ficar lendo sem parar, não se espante de se emocionar lá pelas tantas ou se tiver de rir alto em plena madrugada…