“A roupa nova do rei” é o título de um conto muito antigo. Na Idade Média a história já era conhecida. A versão que chegou aos dias de hoje é uma adaptação feita por Andersen, no século XIX.
Conta-se que um belo dia apareceu no reino um vendedor trazendo o tecido mais precioso do mundo. Tão extraordinário era o tecido que só as pessoas inteligentes conseguiam enxergá-lo. O rei, que, logicamente, se achava o mais inteligente de todos, logo se interessou. Pagou uma fortuna e mandou fazer um traje com aquele tecido magnífico.
Ansioso por admirar a vestimenta especial, dali a alguns dias, o rei convidou seus ministros para visitar o ateliê de costura. Na sala havia uma grande mesa e muitos cabides, linhas, agulhas, tesouras. O vendedor fez questão de ir mostrando a roupa em produção. Como não existia nada, nem o rei nem os ministros podiam enxergar qualquer coisa. Mas, lembrados de que só os inteligentes conseguiam ver o tecido, todos fizeram de conta que admiravam o trabalho inexistente e não viam hora de o rei vestir aquele traje ímpar.
Quando finalmente a costura ficou pronta, o rei marcou um desfile pela cidade para se mostrar ao povo. Uma multidão se aglomerou nas ruas. A passagem do rei foi acompanhada de gritos de admiração. Ninguém queria passar por bobo, por isso todos aplaudiam. Enchiam a bola do rei. E este fazia cada vez mais pose.
Um menino, ao ver o rei passar, arregalou os olhos e gritou para todo o mundo ouvir:
– O rei está nu!
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Só o menino – porque era inocente nas coisas da vida – só o menino foi capaz de reconhecer que o rei estava nu. O menino ainda não tinha aprendido como as pessoas se comportam diante dos poderosos. O menino não sabia que é costume bajular, até rastejar, para agradar os maiores, a um ponto que estes mesmos se convencem de que são superiores de fato.
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Este conto tem dado o que pensar ao longo dos séculos. Por exemplo:
1 – o poder exerce um incrível fascínio, seja para exercê-lo, ou, ao menos, para ficar perto de quem o detém. Só lembrando: o poder está com quem governa países, com quem administra repartições, famílias, grupos, setores. Até as crianças gostam de se achar melhor ou mais do que seus pares e as que se destacam costumam ter seguidores;
2 – o impulso de bajular o poder parece integrar o DNA dos humanos. Por isso há um ditado popular que ensina: “o s…. do chefe é o corrimão da vida”. Guardar para si opiniões e só dizer o que fica bem, é costume que todos conhecemos;
3 – é difícil construir sociedades e grupos de iguais, onde se exerce a verdadeira liberdade de expressão;
4 – são raridade os reis (de todo o tipo) que não reconhecem em si qualidades especiais – as quais, às vezes, só eles enxergam e, mesmo assim, forçam os outros a fazer de conta que enxergam também;
5 – etc.