O cara tava na pior.
E bota pior nisso. Chutado pra fora do serviço como um bicho sem nenhuma serventia.
Chamamos de volta quando a coisa ficar boa de novo – falou o funcionário encarregado dos papéis. Pois sim, enquanto isso ele ia fazer o quê? Cozinhar o vento pra comer? Sem um tostão furado, com o astral no chão, cadê empuxo pra bater nas porta e se oferecer? Onde achar o muque pra segurar essa maré? Onde catar serviço?
Onde? Onde?
E vinha uma raiva grossa, uma raiva que subia do fundo, passava na garganta e queria explodir pra tudo quanto é lado. Mas a boca não achava jeito de falar. Quieto como um boi. Também, ia falar pra quem? Orelha murcha. Ralado do primeiro ao quinto. Pensava nas notícias dos graúdo roubando na maior, os graúdo sacaneando todo mundo e lá no bom. Se ele tivesse a coragem que não tinha, agarrava e dizia tudo. Quebrava o pau. E era bem capaz de acertar a mão na orelha dos bacana que nunca que iam saber o que que a vida era. E ele, agora, ali, no banco da praça, esperando o quê? Ele que tinha só que resolver se roía o pão agora ou se deixava ele pra roer de noite.
Foi então que enxergou a madama passeando com o totozinho pela praça. Cachorro de grãfina era bem bom de ser… Gente fina é outra coisa, como o pai gostava de dizer. Epa! Não é que ela tá arrancando as flor da praça? Meio disfarçada, a madama tá pegando as flor e a praça não é dela não senhora. A praça é de todos e as flor é de todos e ninguém bota a mão nas flor de todos.
E uma coisa veio vindo, veio vindo e ficando mais graúda e ele se alevantou do banco e ele pegou da coragem que não tinha e foi indo pro lado da mulher e o cachorro olhando feio e ele atirou aquela frase bem na cara da safada. Pegou a voz de comandante que nem ele conhecia e disse que a praça é de todos, as flor é pra ficar ali e não bota as mão nela, não bota não senhora! Chispa fora! Chispa!
Gritou com a força dos pulmão, se sentindo autoridade: os dono semos todos, ora bolas!
E viu que tinha feito aquilo assim no susto. Um pouco pela praça, um pouco pelas flor, um pouco pela raiva que vinha pura lá de dentro e um pouco pela vida de cachorro maltratado que levava. Era o jeito de vingar aquilo que vinham surrupiando dele há tanto tempo e aquilo que arrancavam dele cada pouco e todo o dia, todo o dia, todo o dia.