No segundo domingo de novembro, dia 11 último, foram comemorados os cem anos do armistício que marcou o final da primeira guerra mundial (1914-1918).
Houve cerimônias em vários países, mas, acho que nada tão emocionante como a solenidade que aconteceu em Paris e teve transmissão ao vivo pela televisão brasileira. Mais de setenta países se fizeram representar por seus mandatários. Donald Trump, Angela Merkel, Vladimir Putin, Recep Erdogan, entre outros, sentaram na primeira fila para acompanhar o ritual comandado pelo presidente francês Emmanuel Macron.
O discurso emocionado de Macron lembrou os milhões de mortos, os milhões de mutilados e os feridos, além de todos aqueles que sofreram fome, frio, tiveram suas vidas barbaramente afetadas por essa que é conhecida como a guerra mais cruel que a humanidade já atravessou. Macron disse que é preciso lembrar a barbárie como forma de garantir que ela não se repita jamais. Ao seu lado, lendo trechos de cartas enviadas por combatentes, ou fazendo uma corrente enquanto o presidente acendia a pira junto ao monumento ao soldado desconhecido, estavam jovens, com a idade que os combatentes tinham quando foram para a guerra. A presença deles aí simbolizava que o recado estava sendo recebido pelas novas gerações.
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Vidas barbaramente afetadas pela guerra – como disse Macron. Barbárie.
“Bárbaro” é sinônimo de não-civilizado, bruto, rude, grosseiro, cruel, selvagem. Todos, adjetivos perfeitamente adequados para definir o que uma guerra é. Então, quando se faz uma cerimônia pública de reprovação à guerra, como achar jeito de mostrar esse sentimento de repúdio? O que seria o contrário de guerra, de barbárie?
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Fiquei pensando nisso enquanto assistia à cerimônia. Sim, Macron fez um belo discurso. Naturalmente, falou em francês. Quanta gente ao redor do mundo entendeu o que ele disse?
Mas na hora em que soou o violoncelo tocado pelo americano de origem chinesa Yo-Yo Ma… mas na hora que se ergueu a voz da cantora beninense Angélique Kidjo… na hora em que a Jovem Orquestra da União Europeia tocou o Bolero de Maurice Ravel… Nessa hora me dei conta de que o contrário de barbárie é arte.
O que poderia ser trazido que fosse melhor do que a arte para demostrar o lado sublime da humanidade?
O que mostra melhor do que a arte que o ser humano pode se elevar acima da barbárie?
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Especialmente enquanto acompanhava essa obra-prima que é o Bolero de Ravel eu lembrava que podemos pensar sobre o enfrentamento das barbáries nossas de cada dia, todas as vezes em que surge a dúvida entre patrocinar ou não apoiar atividades artísticas…