Eu estava realizando um estágio na universidade do Texas, nos Estados Unidos, e via que um dos estacionamentos sempre tinha vagas sobrando. Pregada num poste, havia uma plaquinha dizendo que era preciso comprar um cartão do valor X para poder estacionar. Como eu não sabia onde comprar nem nunca via nenhum fiscal por ali, comecei a deixar o carro lá. Sabia que era bom me informar melhor, mas pensei que a minha condição de estrangeira, por fora dos costumes locais, me salvaria de eventual aperto.
Pois não salvou.
Um belo dia passaram os fiscais. Notaram que eu não tinha a permissão de estacionar e me deixaram a notificação de uma baita multa. Ligeirinho aprendi onde devia ir para tratar do assunto estacionamento… Até tentei chorar as pitangas no guichê. Tentei invocar a condição de estrangeira, etc. e tal. Mas, como não podia dizer que não sabia ler, paguei. Paguei a multa dolorosa. E aprendi.
Aprendi também como um departamento pode fazer as coisas funcionar, sem muito custo. Não precisa de um batalhão de fiscais. Não precisa de gente o dia inteiro circulando à caça dos faltosos. A fiscalização pode ser responsabilidade de um grupo bem pequeno e ser eventual. Ou seja, basta que saiam a campo de vez em quando. Mas, encontrando alguém fora do esquadro, tem de multar a sério.
A dor no bolso faz aprender a respeitar normas.
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As tragédias recentes em Brumadinho e no alojamento de meninos do Flamengo estão dando o que falar. A indignação é generalizada. Falhas em prevenção e em segurança são gritantes. Também grita o fato de que é difícil pegar os responsáveis. Entre nós, eles costumam se safar da punição. Mas igualmente tenho ouvido muitas críticas à fiscalização e acho que neste ponto há um exagero. Penso que a fiscalização tem papel muito menor do que este que lhe querem dar.
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Já vi acusarem a falta de fiscalização quando um mercado vende produtos fora de validade. Já vi acusarem a falta de fiscalização quando falta higiene em um restaurante. Já vi acusarem a falta de fiscalização quando os pedreiros trabalham sem equipamento de segurança.
Em vez de acusar diretamente o dono do mercado, o dono do restaurante e o dono da construtora, o foco da atenção vai para aquele que deve apenas conferir se as coisas estão de acordo. E não pode estar lá o tempo todo.
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A história da multa no estacionamento da universidade, me serviu muito. Me ensinou, principalmente, a botar os meus erros onde eles devem estar. Ou seja, nas minhas costas. Como dizer que o problema de estacionar em local indevido seria uma falha da fiscalização?
Ou queremos ter um fiscal para cada estabelecimento, um para cada atividade, um para cada cidadão, vigiando durante as vinte e quatro horas, todos os dias do ano?