Impressiona a variedade de produtos para todo tipo de necessidade. Fico tonto quando vou ao supermercado – obrigação que gosto muito de cumprir, confesso – e constato que foram feitas mudanças na distribuição das gôndolas. Fico perdido. Sou do tipo “cavalo de padeiro”, figura que simboliza pessoas que fazem sempre o mesmo trajeto, arraigados na rotina e pouco afeitas a mudanças de comportamento.
Chama a tenção, em especial, a quantidade de opções para o cabelo, por exemplo, onde proliferam xampus e correlatos. Neste segmento destaca-se a mudança dos barbeiros, que voltaram a ter esta denominação depois de serem batizados de “cabeleireiros”, que emprestava um certo charme. Mais do que uma vaidade, cuidar do cabelo é um hábito caro, do corte às especialidades empregadas, passando pelo ambiente.
O mais notório barbeiro que tenho lembrança é o saudoso Cirilo Tischer que, por décadas, trabalhou perto da estação rodoviária de Arroio do Meio, num diminuto espaço. Havia outros profissionais, mas ele simbolizava uma profissão de grande destaque na época. O ambiente de trabalho era simples, com algumas revistas velhas e jornais junto às cadeiras de espera.
Também não havia muitas opções de cortes. Quem decidia isso era o pai.
– Corta bem curto. É verão e assim ele vai suar menos! – ordenava o velho Giba.
Era época de poucos produtos, mas de respeito
aos profissionais que trabalhavam com dedicação
Meu avô, Bruno Emílio Kirst, fundador da Bebidas Fruki, que nasceu no bairro Bela Vista, era metódico em seus hábitos. Vaidoso, fazia a barba todos os dias, passava Aqua Velva, caprichava no Brylcreem, que deixava o cabelo ajeitado e no maior brilho. Mesmo internado no Hospital São José, onde faleceu, não abria mão desses caprichos, que incluía o uso de perfume.
Quando era guri e morava na Bela Vista esperava ansioso pelas férias. Boa parte desta folga passava “na vila”, ou seja, na cidade, na casa dos meus avós. A primeira providência do vô Bruno era me levar à presença do Cirilo Tischer. A gurizada que morava nas redondezas já sabia desta mania e corria até a barbearia para ocupar todas as cadeiras de espera.
Assim que via aquele bando de piás na barbearia, meu avô puxava a carteira e dizia:
– Cinco pilas pra quem deixar eu passar na frente!
Todos, é claro, aceitavam. Assim que pegavam “os pilas”, saíam em disparada. Na verdade, nenhum deles queria cortar o cabelo mas, sabiam que meu avô não tinha paciência e dava gorjeta para furar a fila.
Há anos corto o cabelo em casa. Giovani Moraes da Costa é profissional de um salão que funciona num shopping de Porto Alegre, há mais de duas décadas é o titular da tesoura. Meus dois filhos cortaram com ele desde a infância, mas hoje apenas Henrique mantém o hábito.
Dos meus tempos de piá lembro de quando o Vô Bruno me levou a um barbeiro com quase 70 anos e de pouca visão. No arremate de um corte, manejando uma navalha na nuca e nas laterais, acabei vítima de um corte na ponta da orelha que sangrou por horas.
Nunca mais voltei ao lugar. Mantive fidelidade ao saudoso Cirilo Tischer. Era época de poucos produtos, mas de grande respeito aos profissionais que exerciam seu ofício com dedicação.