“Les bonnes intentions” é título de um filme francês em cartaz. A história ocorre na França atual. Mostra uma senhora, Isabelle, envolvida com trabalho voluntário. Ela ensina a língua do país para um grupo de imigrantes. A professora está bem de vida e os alunos são uns pobres-diabos. Eles lutam para sobreviver num ambiente que quer vê-los pelas costas. Isabelle faz o que pode para ajudar, aceitando, inclusive, a reprovação da família e dos amigos. Ao perceber que, sem carteira de motorista, seus alunos não têm chance de conseguir emprego, Isabelle move céu e terra para ajudá-los a obter.
Não vou dizer que este seja um filme excelente. É, até, meio pobrezinho. Vai ao ponto de assumir preconceitos contra os estrangeiros só para fazer o público rir. O imigrante brasileiro, por exemplo, aparece como um tonto que só quer diversão.
Mas há um momento tocante. É quando a avó de Isabelle morre. Isabelle fica visivelmente abalada. Mas só ela. A cerimônia na capela funerária é vazia, uma espécie de teatro que os presentes não veem a hora de acabar. Isabelle arrisca uma fala na esperança de que a partida da avó ajude os vivos a serem mais amorosos, solidários. Resultado zero. Ninguém se comove. Aí chegam os alunos estrangeiros e se juntam à professora, choram com a dor dela, numa demonstração de grande sensibilidade. Estabelecem um total contraste com a frieza do ambiente.
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Fiquei pensando.
Pensando nos nossos tristes tempos tecnológicos. À medida que progredimos, vamos ficando mais e mais desajeitados para demonstrar sentimentos. Tentamos ignorar nossa humana fragilidade… todos queremos parecer lindos, ricos e felizes. Inquilinos permanentes da ilha de Caras.
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Estabelecemos relações superficiais. Temos uma quantidade de contatos, conhecemos uma porção de pessoas com as quais trocamos mensagens, temos muitos amigos no Facebook, mas pouco acontece além isso. Além dessa proximidade de plástico. Nossas relações – ao contrário do que parece – têm o potencial de nos fazer mais solitários do que nunca. Em primeiro lugar, por que a felicidade que os outros aparentam, nos deixa de fora. Eles são felizes em festas de que não participamos. Por outro lado, quanto mais nossa aparência nas redes sociais é diferente do que nós somos de fato, mais aumenta a dificuldade para saber quem é que nós somos. Se não sabemos quem de verdade nós somos, como poderíamos nos aproximar profundamente de outras pessoas?
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Consumimos boa parte do tempo, mostrando a imagem que queremos que os outros vejam. Parece mais seguro ficar passando um Photoshop na nossa vida do que aceitar as dificuldades, as imperfeições, os fracassos.
Valorizamos muito a embalagem. A ponto de faltar ânimo – ou coragem – para tirar o invólucro e olhar dentro.
O resultado é este: estamos mais sozinhos do que quando não éramos tão belos, tão sorridentes, nem tínhamos essa multidão de “amigos”…