O novo pacote proposto pelo governo do presidente Jair Bolsonaro nesta semana, pegou de surpresa os pequenos municípios brasileiros. Pela proposta, que ainda precisa de aprovação do Congresso, municípios com menos de cinco mil habitantes e que não arrecadam 10% da sua própria receita, podem ser incorporados a outros, em 2026. Ainda não está claro como seria este processo, mas prefeitos e associações representativas – como a Famurs e Amvat – já se manifestam contrários à medida. Entendem que seria um retrocesso, com impactos significativos no dia a dia da população.
Segundo a Famurs, dos 231 municípios gaúchos que têm menos de cinco mil habitantes, 226 têm receita própria menor do que 10% do total da receita municipal, considerando apenas o ITBI, IPTU, ISSQN, taxas e contribuições de melhoria. A média de arrecadação própria desses municípios é de 4,8%. Ficam fora desta regra os seguintes municípios com menos de 5 mil habitantes: Capivari do Sul, Monte Belo do Sul, Coxilha, São João do Polêsine e Arambaré. A média de arrecadação desses municípios é de 11, 7% do total. Para o presidente da entidade, o prefeito de Palmeira das Missões, Eduardo Freire, “a proposta não representa um pacto federativo justo, que valorize os municípios. O projeto foi construído de cima para baixo, sem ouvir as entidades representativas”.
A Associação dos Municípios do Vale do Taquari (Amvat) tambem é contra a proposta do Governo Federal. O presidente da entidade, prefeito de Teutônia, Jonatan Brönstrup, diz que a proposta, uma das medidas apresentadas na PEC do Pacto Federativo, não foi discutida com as entidades representativas e que a associação vai organizar-se politicamente, junto com as demais organizações que representam os municípios, para tratar do tema com deputados e senadores. No Vale do Taquari, conforme estimativa populacional do IBGE de 2019, 21 dos 36 municípios filiados à Amvat têm menos de cinco mil habitantes e seriam atingidos pela proposta.
“Em momento algum este tema foi discutido pelo governo federal com as associações regionais, federações ou com a Confederação Nacional dos Municípios”, ressalta o presidente. “Somos favoráveis a não criação de novos municípios, mas os que existem e seriam extintos estão cumprindo com eficiência seu papel, prestando serviços de qualidade à população, especialmente na área social”, cita.
Um alerta paragestores e habitantes
O prefeito de Marques de Souza, Edmilson Amauri Dörr, acredita que a proposta não vá avançar, mas observa que serve de alerta, tanto para gestores, quanto para a população destes municípios. Aos gestores, no sentido de aumentarem a renda própria do município e, para a população, no sentido de valorizar o comércio local, pedindo nota fiscal ou emitindo a nota, no caso de quem vende, seja comerciante ou agricultor. Diz que a arrecadação do município depende de toda a sociedade que o compõe e que cada cidadão precisa fazer o exercício do “que eu posso fazer pelo meu município e não o que o município pode fazer por mim”.
Para o prefeito, os gestores precisam tratar a coisa pública com responsabilidade e a sociedade tem que fazer sua parte se quiser continuar como município, ajudando para ampliar a receita própria. Comenta que todos querem pagar menos impostos, mas ao mesmo tempo, querem o município funcionando, com recursos para saúde, educação, obras, manutenção de estradas e outros serviços.
Hoje Marques de Souza arrecada cerca de 8% da sua receita. Dörr acredita que seria um retrocesso muito grande voltar à condição de distrito ou a própria junção à outro município e diz que, enquanto gestor vem fazendo sua parte, e vai continuar, para que Marques arrecade mais e gaste menos. Cita como exemplo o enxugamento da máquina, com menos cargos, e a campanha de incentivo ao comércio, que sorteou um carro e uma moto no ano passado, e que alavancou em 24% a emissão de notas fiscais. “Sem medidas punitivas conseguimos ampliar a emissão de notas”, frisa, observando que também há o programa de incentivo para quem emite nota no meio rural. Ainda sobre fazer mais com menos, ressalta que foi gratificante perceber a melhora do município no Índice Firjan de Gestão Fiscal. Marques de Souza passou de 0,8193 tendo 2017 como ano-base, para 0,8311 no ano-base 2018. Quanto mais próximo de 1, melhor é o índice.
Retrocesso
O prefeito de Capitão, Paulo Cezar Scheidt, afirma que a proposta pegou a todos de surpresa e que não é possível mensurar como será, se a medida se consolidar. Acredita que seria muito complicado para os municípios perderem sua autonomia e a população seria diretamente afetada em serviços básicos, como saúde, obras e estradas. “Hoje, os municípios menores são os que têm conseguido manter uma boa saúde e educação. É muito mais fácil de atender as demandas da população sendo um município menor”, avalia.
Para Sérgio Odilo Nied, prefeito em exercício de Travesseiro, a medida é totalmente inviável e prejudicaria muito a população. Afirma que até voltar a ser distrito de Arroio do Meio é difícil, por todo o avanço que a emancipação trouxe para os travesseirenses. Elenca a saúde, a educação e o próprio serviço de máquinas como melhorias que não têm como a população abrir mão. Para ele, seria um retrocesso total.
Aloisio Brock, prefeito de Pouso Novo, também vê a proposta como um grande retrocesso. Assim como os outros prefeitos, salienta que a emancipação trouxe avanços consideráveis para quem mora no município, proporcionando o bom atendimento na saúde, na educação, na manutenção das estradas e em outros serviços. Essa autonomia seria perdida e dificultaria muito a vida das pessoas. Brock acredita que a medida não passe pela aprovação do Congresso.