Um público de aproximadamente 600 pessoas é esperado para mais uma edição do encontro alusivo ao Dia da Mulher, nesta sexta-feira, no Parque de Eventos, em Capitão. Como de costume, o evento reúne mulheres do município anfitrião e de Arroio do Meio e Travesseiro. A programação é esperada por muitas participantes, já que é um dia de reencontros, informação e descontração.
As atividades iniciam com recepção às 8h30min, abertura às 9h e celebração ecumênica às 9h30min. Na sequência será apresentado o documentário produzido por Wanderley Xumby Theves que retrata os 35 anos de história do Movimento de Mulheres de Trabalhadoras Rurais (MMTR), com fatos, fotos e notícias da época e, após, será feita uma homenagem para as integrantes já falecidas.
Para as 10h30min está prevista a palestra de Lurdes Santin, do Movimento das Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos (MTD), seguida da explanação da advogada Bernadete Lermen Jaeger, sobre informes previdenciários.
Ao meio-dia haverá uma pausa para o almoço, à base de lanches, como de costume. As atividades são retomadas às 13h30min, com apresentação humorística Tio e Sobrinho. Será uma hora e meia de muita descontração e risos. O encerramento está previsto para as 15h30min.
Os 35 anos de MMTR
Todo movimento surge a partir de uma necessidade. Com o MMTR não foi diferente. Surgiu como uma forma de resistência, em busca de dignidade, justiça, direitos e valorização da mulher. Nos anos 80, quando o Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais foi iniciado, a situação não era nada favorável os trabalhadores do campo, especialmente para as mulheres. Elas sofriam discriminação e preconceito da sociedade e das instituições.
A mulher não tinha vez nem voz nas decisões da família, das diretorias de comunidades, da escola, das entidades de classe. Como não tinha documentação, a mulher não tinha conta em banco, em lojas, carteira de motorista, ou talão de produtor. Na documentação que possuía, era considerada doméstica ou do lar e dependente do marido ou do pai.
Cansadas desta realidade, as mulheres queriam igualdade e respeito. Trabalhavam na roça, pagavam impostos, mas não tinham o espaço que lhes cabia. As Missões realizadas pela igreja católica, em 1985, plantaram uma semente e a organização enquanto classe criou os meios necessários para que a luta se tornasse realidade e gerasse frutos. Corajosas, as mulheres trabalhadoras rurais deixaram o anonimato e a sombra na qual viviam para serem protagonistas de uma mobilização que transformou a realidade e a vida das mulheres de todo o Brasil.
Arroio do Meio, junto com Cruzeiro do Sul, foi um dos municípios pioneiros no MMTR na região. O Movimento sempre foi autônomo e no início não teve qualquer apoio do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR). Só a partir da renovação sindical, no fim dos anos 80, que o STR passou a apoiar as mulheres e suas lutas. Os grupos de Cruzeiro do Sul e Arroio do Meio sempre foram bem articulados e organizados. Tanto que as primeiras aposentadorias foram conquistadas por moradoras destes municípios.
O caminho nem sempre foi fácil. Marlene Grassi, que há muitos anos milita no MMTR, lembra que as mulheres foram incansáveis apesar das muitas represálias sofridas. Fizeram reuniões, mobilizações, foram para Brasília defender sua causa. Graças à organização, conseguiram fazer constar na Constituição Federal o reconhecimento da profissão de trabalhadora rural, o que lhes assegurou uma série de direitos, como o auxílio doença, o salário maternidade, a aposentadoria, entre outros. Ela destaca que a mulher, tanto lá atrás quanto nos dias atuais, não quis ou quer se sobrepor aos homens, busca apenas a igualdade.
A trajetória das mulheres até os dias atuais será uma das temáticas do encontro de hoje. As lembranças dos desafios enfrentados e as alegrias compartilhadas estarão presentes durante todo o dia. Embora o MMTR não tenha muitas atividades, o encontro do Dia da Mulher é uma programação tradicional, já consolidada e esperada por muitas. “É um dia que a mulher tira para si. Vai no encontro, reencontra amigas, se diverte. Também é um dia luta e resistência, de mobilizar e discutir a situação das mulheres. Ainda temos muita desigualdade e não é só no interior. As mulheres que ocupam a mesma função dos homens ganham até 40% menos. E ainda tem a questão da violência, que está em todas as classes sociais e espaços”, frisam Marlene e Gladis Berwanger, que também integra o MMTR.
As duas ainda observam que a mulher é uma cidadã e ainda tem muitos espaços a conquistar. Defendem que quanto mais igualdade, com a mulher mais participativa e respeitada em todos segmentos, mais justa e igualitária será a sociedade. “A mulher ainda tem muitos espaços a conquistar. E espaços que lhe são de direito, deve haver igualdade”.
O Encontro das Mulheres é promovido pelo MMTR, Administração de Capitão e STR. É aberto para quem quiser participar, independente de ser do meio rural ou urbano.
Manifesto das Mulheres Trabalhadoras Rurais do Encontro Estadual – 17/10/1985 – Gigante da Beira-Rio de Porto Alegre
Nós mulheres rurais, que trabalhamos de sol a sol, todos os dias, toda a vida, não somos reconhecidas como trabalhadoras. Nós mulheres, que criamos nossos filhos que serão os futuros trabalhadores da sociedade, que produzimos o alimento para a mesa do povo da cidade, não temos direito a nada.
Quando a gente se machuca na roça, não temos direito à assistência médica e nem ao auxílio por acidente de trabalho. Quando ficamos grávidas, trabalhamos até o último momento e não temos direito ao auxílio natalidade e a um salário maternidade. E na velhice, não temos direito à aposentadoria, nem por idade, nem por invalidez e nem por tempo de serviço. Nós somos consideradas dependentes dos pais e dos maridos, mas nem isto nos assegura o direito previsto na lei de total assistência médica e hospitalar. Estas são conquistas que as companheiras trabalhadoras da cidade já conseguiram há muito tempo, mas que até hoje são negadas para nós. E isto apesar de estarmos contribuindo com a Previdência, pagando 2,5% sobre tudo o que produzimos.
Representamos 50% da força de trabalho na agricultura e na pecuária. Mas trabalhamos sem segurança, sem garantias, sem direitos. E dia a dia constatamos que nossa situação fica mais difícil, pois não temos preços justos para os nossos produtos e nem uma política agrícola definida de acordo com os interesses dos trabalhadores. Além disso, nem todas as nossas famílias têm terra suficiente para trabalhar, enquanto alguns poucos concentram terra para negócios. Assistimos diariamente a fuga dos nossos filhos para as cidades, onde vão em busca de empregos e melhores condições de vida, mas que muitas vezes acabam se marginalizando. Assistimos com pesar o ensino nas escolas se tornar cada dia mais deficiente, nunca sendo voltado para a realidade e as necessidades do povo da roça.
Considerando toda essa situação de injustiça e dificuldades, nós as trabalhadoras rurais, reivindicamos o seguinte:
– Reconhecimento da profissão da mulher como trabalhadora rural;
– Aposentadoria aos 50 anos de idade, por invalidez e aos 30 anos de serviço. Que a aposentadoria seja pelo menos de um salário mínimo;
– Auxílio de acidente de trabalho;
– Auxílio natalidade e salário maternidade;
– Assistência médica, hospitalar, ambulatorial e odontológica, sem a cobrança de taxas extras e de diferenças;
– Uma política agrícola definida, de acordo com os interesses dos trabalhadores.