No tempo em que morei na França, tive convite para almoçar na casa de uma amiga. Era uma francesa, a Valerie. Seriam poucas pessoas no almoço, umas cinco ou seis – a Valerie explicou – enquanto prometia uma refeição típica. Eu fiquei curiosa. Especialmente por lembrar de um filme, “A festa de Babette”, famoso exatamente por mostrar uma refeição à moda francesa. A Babette do filme está refugiada numa aldeia pobre da Dinamarca. Quando ganha na loteria, gasta o dinheiro com um jantar maravilhoso.
Bom, a Valerie pediu para chegar pelas 11horas da manhã. Se eu descrever o almoço, você vai entender por que a refeição terminou no fim da tarde. Vai entender também por que eu não esqueci da coisa.
Foi assim: os pratos vinham em sequência, sem nenhuma pressa, já servidos em pratos lindos e colocados diante de cada convidado. Primeiro apareceu um caldo frio, pois era tempo de verão. Depois, um risoto de cogumelos. Em seguida, costeletas de cordeiro com legumes e salada ao molho de mostarda. Então, um peixe passado na manteiga. Conversa vai, conversa vem, chegou uma tábua com queijos diversos acompanhados de figos frescos e de nozes. A missão dos queijos era colocar uma cortina entre a primeira e a segunda parte da refeição – eu aprendi ali. Os queijos deviam fazer esquecer o sabor salgado e preparar para o doce que viria. Aí, foi a vez de um sorbet – que é um sorvete preparado com polpa de frutas, mas sem leite. E, enfim, a sobremesa: mousse de chocolate. A rodada seguinte coube às frutas frescas. Na sequência, serviu-se um café e, por fim, licores. Ufa!
Não pergunte qual bebida acompanhou o almoço, que eu não sei dizer. Talvez tenha tomado além da conta…
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Me lembrei do almoço da Valerie, ao pensar no tema do churrasco para o programa Sala de Espera, na Rádio Independente. Acho que lembrei, principalmente, pelo contraste entre os estilos.
Adoro o clima do churrasco. Isso de juntar gente ao redor do fogo, conversar, tomar uns tragos, filar uma lasca da carne que fumega e desprende aquele cheiro inconfundível… é mais que bom. Churrasco é encontro sem frescura. Passa longe do ritual francês que descrevi acima. A churrasqueira é um palco aberto e integrador: convida ao riso fácil; as visitas podem circular e dar palpite; o churrasqueiro é um sujeito camarada.
Mas churrasco bom tem que ser com tempo, tal e qual a refeição francesa.
Quando vem a atucanação, ou seja, quando o tempo é atropelado e só fica o cenário do churrasco… aí já não sei. Isso de sentar à mesa já e já, que a carne vai passar, que a bebida vai ficar quente, que tá na hora… tira a graça. E então não sobra muito. Sobra a mesa, a carne, a salada e bocas que mastigam.
A pressa é inimiga de uma festa boa.
É ou não é?