No Brasil a cesta básica é composta por 13 alimentos: carne (6,5kg), leite (7,5l), feijão (4,5kg), arroz (3kg), farinha (1,5kg), batata (6kg), tomate (9kg), pão (6kg), café (600gr), banana (7,5 dúzias), açúcar (6kg), óleo (900ml) e manteiga (750gr).
De acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), em julho (último dado oficial), o trabalhador precisou comprometer, em média, 55,68% do salário mínimo para comprar a cesta básica.
O Dieese calcula que, para alimentar uma família de quatro pessoas, com dois adultos e duas crianças, o salário mínimo ideal deveria ser de R$ 5.518, mais de cinco vezes o valor atual.
A pesquisa também mostra que o brasileiro precisa trabalhar mais tempo para comprar os produtos da cesta básica. No mesmo período do ano passado, considerando uma jornada de oito horas por dia, o trabalhador levava 12 dias para comprar a cesta. Em julho deste ano, esse tempo subiu: são 14 dias. Ou seja, quase a metade de um mês inteiro de trabalho só para comprar o básico da alimentação.
Ceia de Natal será mais salgada
O sócio-administrador da Rede Prass Cristiano Henrique Prass revela que, de primeiro momento, os alimentos que mais sofreram o impacto foram o arroz, o óleo e a carne, seguidos pelo açúcar. As variações chegaram a uma média de 70% a 100%. “Analisando o óleo, a dona de casa deve lembrar que pagava de R$ 3,50 a R$ 4, enquanto agora paga de R$ 7 a R$ 8”.
Segundo ele, a alta está ligada a vários fatores, mas um dos mais significativos é a desvalorização do real. Ficou muito atraente para as indústrias a exportação. Mas também não dá para esquecer que a “engrenagem econômica” foi quebrada.
As paralisações nas linhas produtivas tiveram um impacto muito significativo nessas altas. “A grosso modo, não tivemos redução de preço, mas muitas indústrias tiveram de se reinventar, para que não houvesse um impacto tão grande para o consumidor. Desta forma, a maioria das diferenças passou desapercebida”.
Um exemplo que cita, é a troca das embalagens. Muitos produtos trocaram suas embalagens. Antes vinham embalados em vidro ou lata, sendo modificadas para outras opções como sachês, devido à então falta do produto/matéria prima no mercado e, consequentemente, à grande alta desses produtos, o que obrigou as indústrias a se reinventarem.
Segundo Prass, não houve redução de preços, mas uma adequação de embalagens, embalagens promocionais, os famosos “leve mais e pague menos”, que tiveram uma procura significativa na preferência e escolha do consumidor, salientando que, os produtos de uso de dia a dia, tais como verduras, frutas e legumes, os que são da época, ajudam a suavizar o bolso do consumidor.
Fora da cesta básica, materiais de higiene/limpeza, foram outros que assustaram o bolso do consumidor, com variações de 20% a 30%. A variação nesses produtos se deve muito pela alta das embalagens e a matéria-prima importada.
Conforme Prass, o consumidor, na sua grande maioria, mudou seu comportamento de compra. O mais notório foi que ele se tornou mais objetivo. Os salgadinhos, bolachas, chocolates, itens mais supérfluos, começaram a ficar de fora de muitos carrinhos de compra. O cliente começou a centralizar seus itens em produtos promocionais, deixando de lado muitas marcas de sua preferência para que, assim, pudesse levar opções mais em conta, tendo uma redução expressiva ao final de sua compra. “Acredito que a pior fase já passou, mas a inflação ainda não nos deixará em paz. Com a alta dos combustíveis, os fretes impulsionaram novamente o custo dos produtos, não de uma forma tão representativa mas, com certeza, impactará no custo final das mercadorias. Já é possível adiantar que a ceia de Natal vai ser mais salgada neste ano. Teremos reajustes significativos na lentilha, tradicional prato da época, isso por se tratar de um cereal importado”.
Itens de primeira linha foram trocados por mais baratos
A
gerente da divisão varejo da Dália Vera Beneduzi avalia que todos sentiram os efeitos da pandemia de alguma maneira, seja na forma mais severa, que é a perda da saúde e principalmente da vida, ou nas despesas do dia a dia, que tornaram-se muito mais complicadas para fechar as contas.
É evidente o aumento dos preços nos itens básicos que estão presentes na mesa do brasileiro diariamente. Os grandes vilões, sem dúvida, foram a carne de rês, óleo de soja, arroz, feijão e açúcar. “Segundo o Dieese, o acúmulo na cesta básica nos últimos 12 meses na região Sul do país chegou a mais de 20% onde, de acordo com os nossos fornecedores, o aumento foi devido ao custo de produção, à escassez de matéria–prima e sucessivos aumentos do petróleo, papel e embalagens em geral”, analisa.
No setor de hortifrúti a variação não foi tão grande como nos outros departamentos, tratando-se de variações pontuais devido às condições do tempo. Nos produtos que ficam de fora da cesta básica houve um aumento ainda maior, tendo como agravante a alta do dólar, pois grande parte dos insumos para produção de itens de limpeza e higiene são importados.
Bebidas e utensílios domésticos de uso geral também tiveram um aumento devido à crise do alumínio, plástico e vidro. Assim como a carne de rês, que tem sido substituída por carne suína e de frango, materiais de limpeza de 1ª linha foram trocados por itens mais baratos. O leite também teve uma variação nos preços, mas a venda se manteve enquanto os derivados como iogurte, queijos e manteiga tiveram uma queda nas vendas.
Segundo Vera, as mudanças nos hábitos de consumo ficaram muito evidentes nesses últimos meses, devido principalmente à pandemia e, junto dela, à crise econômica. A médio e curto prazo a tendência é de que os preços não recuem. “Nos próximos meses, vamos ter uma crise energética no país, encarecendo ainda mais a energia e, consequentemente, o custo de produção. Estamos constantemente revendo processos e melhorando cada vez mais a eficiência de produção, para impactar o mínimo possível no preço final dos produtos e sempre praticando um preço competitivo e justo”, pondera.
Preços dificilmente vão baixar
O comprador do Supermercado Marel Diego de Souza revela que a carne bovina e o óleo de soja são os produtos que mais tiveram alta nos preços. A valorização do dólar elevou o preço das commodities e a exportação ficou mais atrativa para as indústrias de proteína animal. Ele explica que as pessoas não deixaram de consumir carne de rês radicalmente. Mudaram a preferência em torno de alguns cortes e aumentaram o consumo de carnes suína e de frango. “A carne suína também havia elevado, agora está com preço mais interessante que a de frango”, apura.
Conforme Souza, os demais itens da cesta básica, como feijão, arroz, açúcar e farinha também tiveram altos e baixos, e tendem a ficar mais caros, e o consumidor está mais atento a promoções envolvendo produtos de qualidade. “As incertezas na economia e no quadro dos funcionários, e rumores de fechamento do varejo, fizeram que o estoque dos fornecedores ficasse reduzido, e isso aliado à falta de embalagens, elevou os preços num todo. Mas, mesmo sem eventos, as vendas não diminuíram, inclusive as bebidas, onde havia forte especulação de queda de consumo. O nível de estoque ainda não está alinhado com a demanda. O que motiva nós, do varejo, a estarmos constantemente negociando com fornecedores e nos reinventando para atender a exigência dos consumidores”, detalha.
Nos outros itens, fora da cesta básica, não houve oscilações expressivas. Com o avanço da imunização, retorno da rotina e festas de fim de ano, a perspectiva é de que os indicadores de vendas repitam os números alcançados nos últimos anos. Entretanto, dificilmente prevê uma redução nos preços. No máximo, uma estabilização.
Combustível é o grande vilão
O microempresário do setor de transportes, Jaime Biasibetti, 59 anos, de São Caetano, revela que a principal mudança de hábito no consumo foi a substituição de carne de rês pela de frango ou suína, que também ficaram mais caras, mas continuam acessíveis. “Tudo ficou mais caro, inclusive produtos supérfluos como refrigerantes, mas o alimento é necessário assim como o combustível, que é o grande vilão dessa inflação, pois é indispensável na rotina das pessoas e empresas, e acaba refletindo em todos os outros itens. O governo precisa rever a política de preços”.
Não se sabe onde vamos parar
A moradora de Lajeado, Célia de Amorim, 53 anos, também reduziu o consumo de carne de rês para apenas duas vezes por semana, fez cortes gerais e migrou para marcas mais baratas. “Não existe nada mais barato. O gás está uma loucura. Não sabemos onde vamos parar”.
Famílias precisam se alimentar
Bárbara Kist, 40 anos, moradora bairro Aimoré avalia que a inflação está muito alta, atinge todos os tipos de produtos, o que demanda uma migração de marcas de primeira linha para mais baratas. “Não é só no supermercado, é o comércio num todo. Tudo está mais caro, mas as famílias precisam se alimentar, não há como fazer cortes”.
Não está sobrando dinheiro para imprevistos
O serralheiro Maicon Santos da Silva, 35 anos, avalia que o orçamento não permite mais o mesmo consumo de um passado recente. “A carne de rês está muito cara. Mudei de marcas de óleo de cozinha e de erva-mate. O mais complicado é que não está sobrando dinheiro para a economia, para uma futura aposentadoria ou até mesmo para imprevistos”.