Cansada do marido farrista, a indignada esposa o expulsou de casa. Não bastava a crise pós pandemia, que lhe roubava clientes na loja, ainda tinha de aturar as escapadas conjugais. As amigas a recriminam. Ele era trabalhador, simpático e boa pinta, embora volta e meia sumisse. Um carteado em lugar ermo, pescarias em açudes de sereias e um celular repleto de números e ligações estranhas em horários incômodos. “Curto música sertaneja, mas de sofrência não morro”, respondia, ao justificar a decisão.
Filhos criados, quase cinquentona, não precisava aturar um gato fujão em casa. O único felino naquele seu espaço teria quatro patas. Referia-se a Charles, um siamês de personalidade forte, por coincidência, presente do marido que, aliás, não se conformou com a expulsão. Queria mais uma chance. Mas ela resistia bravamente ao assédio de flores e ligações chorosas. E jurou que também iria cair na noite com as amigas.
Mas o gosto por duplas sertanejas, desta vez, lhe mexia com as emoções. Bastava ouvir o refrão “…A terceira música nem acabou. Eu já tô lembrando da gente… Celular na mão, mas ele não tá tocando…” e os dez por cento aumentavam na conta da saudade (Maiara&Maraísa). No meio de tudo isso, até o siamês sumiu. Bateu um temporal, entre raios e trovões e o gato não estava nos esconderijos costumeiros. Outro macho a decepcionava. Charles, pelo menos, era solteiro e independente, como todo bom siamês.
Uma semana depois, apareceu o marido confessando o “sequestro” do gato. Só o devolveria se o aceitasse junto. Jurava ter amadurecido. Argumentou – entre risos – que agia igual aos gatos que gostam de passar a noite na rua, e sempre retornam. Ou seja, se as mulheres amam os bichanos, devem compreender também homens, com as mesmas características. A infeliz comparação aumentou a indignação da esposa.
Mas a noite tinha sido pavorosa. Chuva e vento, os bares estariam vazios de gente que a atraísse. Também sentia falta do “cretino sem-vergonha”. Assim, abriu a porta e entraram, felizes, homem e bichano. Mas alertou, com olhos de gata arisca: “Só castração acalma um gato fujão. Então, o mesmo vale aos homens.”
“Não brinca assim…”, gemeu o marido. Ela falava sério. No dia seguinte, o bichano foi castrado. Acabavam assim as noitadas de cio. O outro gato, impactado, acalmou-se. Teve “castrado” o celular, que ganhou um novo número, e, pior de tudo, senha compartilhada. As festas e pescarias, ela acompanharia, caso contrário, permanecem em casa assistindo séries.
Não sei se um marido fujão tem cura, mas por enquanto ela está bem satisfeita com o ronronar dos bichanos caseiros. E ainda economiza os tais 10% em sua cota de sofrência sertaneja.