Ivete Kist
A passagem do Dia Internacional da Mulher acende debates compridos. A prova é que me ocupo do tema além do esperado. Uma razão para voltar ao assunto são as palestras que venho fazendo em vários lugares e que dificultam mudar o foco na tela. Outra, a constatação de que o cenário resiste a mudanças, mais do que seria de prever.
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Lavando a roupa da casa, escovando o chão do banheiro ou suando na boca do forno, uma mulher pode bem perguntar por que seriam femininos esses encargos, enquanto assistir ao Jornal Nacional parece coisa mais masculina.
Trocando o pneu do automóvel, cortando a grama nos fundos ou levantando de noite para enfrentar barulhos suspeitos, um homem pode também perguntar por que isso fica sempre com ele.
Seja como for, as mulheres se consideram desfavorecidas na repartição das tarefas. Acham que a desigualdade começa dentro de casa. Dizem que os homens relutam em dividir os serviços domésticos.
É curioso observar que a reclamação das mulheres é igual ao que era, antes que o trabalho fora de casa fizesse cair a proporção de mães/esposas em tempo integral.
Verdade que muita coisa mudou com a profissionalização das mulheres. Decresceu nas famílias o número de filhos; as creches entraram em cena e eletrodomésticos vieram aliviar as tarefas. Mesmo assim, uma série de ideias não foram mexidas. Ficou, por exemplo, a noção de que há brinquedos e cores que são de meninos e não de meninas. Esportes, também. E aquilo que acima dissemos vigora. Ou seja, ainda há papéis pré-fixados para um gênero e outro. É como se as pessoas tivessem de seguir um roteiro. Mudam os tempos, mudam as leis, mas não se trocam costumes.
– Como/quando vamos chegar à almejada igualdade, aquela mesma que já é bem concreta na Escandinávia, por exemplo?
Aí está uma pergunta de difícil resposta. Dizem estudos que, a seguir neste ritmo, o Brasil levará 132 anos para estabelecer a igualdade de gêneros.
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Vale lembrar que ao longo da história a iniciativa de fazer as mudanças cabe ao segmento que se acha prejudicado. Quero dizer, é o grupo deixado pra trás que tem de puxar o cordão. Quem está satisfeito não lembra que é possível trocar a orquestra no baile…
Isto significa que a mudança do quadro atual, naquilo que ele não satisfaz, incumbe principalmente às mulheres.
Mas enquanto elas mesmas acharem direito deixar os meninos brincando e mandar as meninas limpar a cozinha – enquanto isso acontece -, as chances de novos avanços permanecem adiadas.