Ari Teixeira
Jornalista
“As muito feias que me perdoem, mas beleza é fundamental”, escreveu um dia Vinícius de Moraes. Mas a qual beleza referia-se o sensível poetinha? Seria a mesma citada pelo genial Fernando Pessoa, ao afirmar que beleza é o nome que damos às coisas em troca do agrado que estas nos oferecem? Desse jeito, o encantamento meramente carnal muito pouco significaria. Afinal é perecível. Então por que insistimos tanto e valorizamos o conceito do belo que os modismos impõem?
O que acontece quando a natureza não favorece a mulher com a plasticidade das top-models anoréxicas? Mais delicada ainda a situação daquelas que chegam à maturidade em constante briga com a balança. Trocaram a autoestima por quilos de guloseimas e ansiedade. É mais ou menos assim que uma amiga minha, a Joana, enfrenta a condição de gordinha solitária. Quando arrisca sair do isolamento vive situações, no mínimo, hilárias.
Em noite dessas, depois de alguns chopes, Jô relaxou a guarda e aceitou a sedutora proposta de uma madrugada sexy à dois. Quando se deu conta, seu príncipe saía de uma ducha enrolado em uma reveladora toalha branca. Neste exato instante, caiu-lhe a ficha do medo. Sentia-se deslocada, uma matrona gorda e sem charme diante de um provável candidato a deus grego. O mais assustador é que não poderia voltar atrás.
Desesperada, enrolou-se no lençol e correu para a banheira de espumas. Ainda coberta pelo improvisado casulo de panos, foi mergulhando vagarosamente na água morna até submergir sem revelar um único pedaço do corpo fofo. Depois do relaxante banho de sais aromáticos, repetiu a intrincada operação em sua improvisada burca. Sentia-se um charutinho de repolho, “uma baleia empanada”, me disse.
Para não ser surpreendida em sua nudez, dirigiu-se quase rastejando até a cama redonda onde ele a aguardava, impávido colosso. Não sabia o que fazer para não ser vista totalmente. Assim, escudada pele toalha, ajoelhou-se aos pés da cama e foi subindo feito imenso réptil. Ele, sem entender o que ela pretendia, deliciava-se com o estilo misterioso e fugidio. Ao perceber que o amado estava pronto, saltou sobre ele com todo seu peso, permitindo-lhe apenas os movimentos necessários.
Foi uma espécie de batalha a meia luz, onde cegava o amante com beijos e afagos, a ocultar tudo o que desprezava em seu corpo. Pobre Joana. Enquanto relatava sua aventura, eu lembrava do filme “Garotas de Calendário”, do diretor inglês Nigel Cage. Baseado em fatos reais sobre as senhoras que, embora longe de qualquer padrão estético moderno, decidiram posar nuas. E deram um verdadeiro banho de sensualidade e espontaneidade.
Para que enrolar-se em lençóis, fugir em meio a espuma de uma hidromassagem ou pior, apagar todas as luzes nos momentos amorosos? Não existe um único formato para a beleza. Nem esta morre com a idade ou porque se é muito gordo, ou muito magro. A Jô estava tão preocupada em não afugentar seu parceiro que esqueceu a glória de superar medos e insegurança assumindo-se como é.
Ela repetiu a dose com o mesmo namorado e, com certeza, não conseguiu esconder-se mais. Mas o medo de fracassar, de não sentir-se desejada ainda assusta. Justo na fase mais madura de sua vida. Ou seja, quando poderia amar sem receio de ofender ou desagradar ninguém. Simplesmente permitir a si mesma, a sensação de ser desejada. Como de fato, acontece uma, duas ou tantas vezes àqueles que percebem a verdadeira formosura.