“Quem se diz ser livre, totalmente desplugado de problemas está mentindo ou perdeu a razão”. Meu amigo Jorge é o autor da afirmação e foi além: “Até o final do ano muito ainda está para rolar em situações críticas e, principalmente, muito bate-boca. Temos campanha eleitoral pela frente”. Ele lembrou notícias tristes, como as mortes de Silvio Santos e Alain Delon, “os astrólogos sugerem coisas assim como aumento de doenças autoimunes e problemas emocionais”, jura com os olhos vermelhos e expressão tensa de pura ansiedade.
Em tom enérgico eu pedi: “Troca o baixo astral por uma cervejada com a turma antes que o mundo acabe”. Mas Jorge é teimoso e adora a leitura das “verdades” de redes sociais. Está quase cancelando as férias programadas para dezembro, temendo um desastre financeiro na micro empresa que dirige. “Somos apenas quatro, eu, um sócio e dois colaboradores”, me detalha.
Lembrei que ele é do ramo de alimentos, ou seja, mesmo com a grana curta, as pessoas não ficam sem comer. Pode reduzir vendas, mas os donos de mercadinho nunca irão à falência. Sei que o crescimento nos negócios exigirá mais esforço, planejamento e persistência, mas não combina com falência.
Sugeri que assistisse mais algumas séries bacanas na tevê. Temas leves, nada de um clima tenso como “Breaking Bad”, que ele acompanhou impressionado. Sim, um mundo malvado realmente existe. Mas deixei claro ao Jorge e a todos os inseguros que o acompanham nessas teses pessimistas que posar de vítima enquanto a vida rola – entre bons e maus momentos -, só atrasa tudo.
Eu vivi essa ansiedade quando era mais jovem. Sofria só de pensar em doenças virais, quase abandonava tudo ao sentir que algum colega me criticava, de olho em meu cargo ou cliente. E lá ficava eu em meio a um bom momento profissional, imaginando que tudo acabaria logo adiante. Isso me deixava cansado e apático. Melhorei com a psicanálise. Três longos anos no divã para abrir a mente.
Percebi que a maneira equilibrada em que eu enfrentava as agruras típicas de minha profissão, em um mercado fechado e frágil, estava correta. Não fugia de pautas, ou clientes difíceis. Aliada a capacidade profissional, eu consegui dosar autoconfiança. Juntas me permitiram estruturar ações práticas do cotidiano. Ainda inconformado, voltou ao ataque me enviando um guia astrológico assegurando que de setembro até novembro, devemos estar preparados para grandes mudanças. Boas e ruins.
“Crises que estavam resolvidas poderão voltar ou, então, consolidar coisas boas que estávamos planejando”. Desta vez, com minha paciência de monge medieval no limite, expliquei ao, cada vez mais chato Jorge, que ao invés de buscar teses nas conjunções estelares, eu optei em juntar conhecimento e sensibilidade, para enfrentar o cotidiano. E mesmo quando espio o horóscopo, só por curiosidade, percebo que estou acertando o passo, com poucos tropeços. Sem chutar estrelas.
Por Ari Teixeira