Lembro quando eu sonhava em ganhar na Loteria Esportiva. Era a possibilidade de um carro novo, da casa própria ou férias em mares nunca antes navegados por assalariado feito eu. Gastei um bom dinheiro com isso. Era o bolão dos colegas de trabalho, ou da família. Uma única vez ganhamos. Mas a desilusão veio em seguida quando descobrimos que outros milhares de apostadores haviam acertado os 13 jogos.
Mas mesmo nesse período, nunca abandonei os estudos ou as chances de um trabalho melhor remunerado. A prioridade era crescer profissionalmente e lutar por reconhecimento e não virar pauta de jornal, como hoje acontece. Querem um exemplo? Leio em reportagem de O Globo que, cada vez mais, os brasileiros abrem mão da graduação para gastar com bets e o jogo do tigrinho.
Uma pesquisa realizada a pedido de instituições privadas mostrou que 35% dos interessados em fazer um curso superior em 2024 não se matricularam por que colocaram todos seus recursos em apostas on-line. Isso representa cerca de 1,4 milhão de pessoas. Nas famílias com renda de até R$ 2,4 mil por pessoa — um público alvo importante para o setor de ensino privado —, esse indicador é ainda maior e chega a 39%. Quando se olha para os que ganham até R$ 1 mil per capita, vai para 41%.
Em outras palavras, a invasão de sites de apostas está representando uma verdadeiro desastre – uma autêntica cadeirada (aproveitando o momento político), na disposição pelo ensino superior ou técnico avançado entre os brasileiros. A coisa é tão séria que uma entidade que eu nem sabia existir, o Instituto Brasileiro do Jogo Responsável (IBJR), que representa as principais casas de apostas do país, promete, a partir de janeiro de 2025, regulamentar um número máximo a ser gasto por dia. A proposta é limitar jogadores que buscam nos jogos “um meio de vida em vez de entretenimento”.
Não será fácil essa mudança. Até o comércio já nota que o aumento da renda dos brasileiros não tem significado aumento de consumo. Enquanto isso, o setor de apostas movimentou R$ 100 bilhões em 2023, algo próximo de 1% do PIB brasileiro. Um dos frentistas do posto onde costumo abastecer meu carro, reclamou na semana passada que havia gasto R$ 400 com as bets e assim, ficara sem dinheiro para o rancho da família.
“Me iludi na esperança de ficar milionário”, lamentou, acrescentando que a esposa garantiu as compras do mês, mas quase o botou para fora de casa. Essa expectativa de dinheiro fácil, muitas vezes se transforma em vício. Antes que o problema cresça ainda mais é urgente essa nova regulamentação das apostas, somadas a fortes campanhas de conscientização. Um joguinho eventual, tudo bem, mas quando se transforma em doença, precisa ser diagnosticado e imediatamente remediado.