Na década de 1980 eu atuava numa comarca do interior e tinha o hábito de circular pelo fórum para ver como as coisas estavam funcionando. Procurava conversar com as pessoas, ver se estavam sendo atendidas.
Sempre dava uma passada na sala dos oficiais de justiça para ver como estavam indo as intimações. Como meu pai foi oficial de justiça – sabia bem das dificuldades – procurava ouvir os problemas e sugestões como melhorar.
Numa ocasião, ouvindo as queixas sobre as dificuldades, contaram-me que, às vezes, um deles ia a um lugar distante e, logo em seguida, tinha que retornar para lá para intimar outra pessoa
Sugeri que os oficiais se reunissem e discutissem como funcionaria melhor: divisão da comarca por área ou divisão dos oficiais de justiça por vara. Optaram pela segunda hipótese. Determinei que escolhessem e lotei dois oficiais em cada vara.
Dali em diante meus oficiais passaram a praticar atos que só eles poderiam fazer: citações, penhoras, apreensões, etc. Todas as intimações poderiam ser feitas pela forma mais ágil. Sugeri que imprimissem cartas intimatórias e não mais se expedissem mandados.
As cartas eram endereçadas a mão e entregues ao oficial que usava o correio, o vizinho, o comerciante ou o ônibus, meio que é muito comum no interior, ou a rádio local. Somente se a carta voltasse é que o oficial, de posse da própria carta, procurava a pessoa e entregava ou certificava que estava em lugar incerto. Funcionava como um relógio.
Passei a fazer a intimação dos advogados pelo jornal local. Fazia mais sucesso que a coluna social. Simplifiquei os editais para baratear custos. Determinei que os oficiais consultassem o executado sobre o valor penhorado, dispensando a avaliação se o credor concordasse. Posteriormente criei o depositário e o leiloeiro oficial na comarca.
A porta do meu gabinete estava sempre aberta. Eu atendia as partes e advogados a qualquer hora, inclusive durante as audiências, o que hoje seria impossível pelo número de processos atribuído a cada juiz.
É incrível como a confiança infundida com a presença do juiz fazia os lances subirem nos leilões e praças.
De vez em quando ingressava no cartório e flagrava processos parados. No próprio balcão passava a despachá-los, determinando seu andamento.
Numa dessas caminhadas entrei no setor da distribuição dos processos e contadoria, onde os processos eram distribuídos ou baixados, e realizavam-se os cálculos para execução e pagamentos.
Qual não foi minha surpresa quando vi diversos vasos com plantas, colocados na janela para apanhar sol. Poderia ser algum funcionário que fosse adepto da floricultura e quisesse alegrar o ambiente. Ou chá para preparação de uma infusão para estimular os funcionários. Mas achei estranho.
Chegando mais perto da plantação fiquei ainda mais desconfiado e questionei um funcionário o que era aquilo.
– É maconha que foi apreendida pela polícia e enviada junto com o inquérito. Doutor, não sabíamos o que fazer. Estamos regando e colocando no sol para que não morra.
Determinei que fosse imediatamente incinerada, com certidão nos autos, antes que um flagrante de drogas acontecesse dentro do próprio fórum.