E aí estava eu, compenetrado na fila do caixa, no supermercado, com minhas comprinhas semanais quando uma mulher, ao me ver, corre para um abraço. Era uma antiga colega de trabalho. Cabelos curtos e branquinhos, apesar de bem mais jovem que eu e, por isso, quase não a reconheci. Ele percebeu, riu e desculpou-se. “Sou tua fã”, justificando o gesto. Explicou que trata problemas de saúde e, das coisas boas nesse período de recuperação, inclui meus textos e fotos, “sempre originais” que ela curte nas redes sociais.
Eu ri, porque naquele momento, eu pensava justamente em reduzir as publicações de pouca leitura no Facebook. As pessoas querem textos curtos, postagens que exigem pouca ou nenhuma reflexão. Eu não me sinto um filósofo, apenas um jornalista muito observador das coisas que rodeiam. O foco ainda é o leitor de jornal, que ainda curte uma crônica bem humorada, ou que lhe estimule a emoção sem ser piegas ou odioso. Um alívio ao noticiário sempre duro e, se bem feito, fiel à realidade.
Seguimos nossas rotinas, às vezes aos trancos, porque coisas ou energias nos perturbam. É a sensação de abandono, de ninguém me ama, ou sonhos craquelados que podem resultar em um involuntário desânimo. Esse colega, com seus cabelos brancos e um olhar muito diferente da atitude dos dias passados, trocou o perfil “eu-sei-tudo” por uma humildade defensiva contra o retorno de energias ruins. Em nossos dias de trabalho, seguidamente ela reclamava do meu jeito de atuar. Mas não o fazia para mim, a coisa acontecia naquele mecanismo de fofoca, criando um clima esquisito na equipe.
Eu sempre soube filtrar essas correntes – os grupinhos – formados às vezes de forma defensiva quando percebem o sucesso de alguém, isoladamente mas que, no meu caso, nunca deixei de compartilhar méritos. Cada matéria que resultava em pauta positiva na mídia, tinha a resposta de um silêncio ciumento na sala de trabalho. Mas eu nunca fiquei chateado com isso e, quando a vi, ali convalescendo de um mal muito maior, não deixei me levar pela indiferença. A convidei para uma discussão de bobagens e fofocas, em uma boa cafeteria.
Os comentários maldosos do passado, como sempre, foram vencidos pela verdade de quem nada tem a esconder. E se eu puder ajudar essa que, afastada do espaço profissional, passou a admirar minha escrita, o farei sem ranço ou falsidade. Estamos aí para abrir mão da energia ruim e, quem sabe, no meu caso, agradecer. Poderão me dizer que ela, outra vez, agiu na base da falsidade. Mas aí, vejam bem, continuará sem me atingir e aos poucos, quem sabe, ajudará outra pessoa filtrada por amarguras, a adoçar a conversa na sinceridade. Essa, a virtude exclusiva daqueles que aprenderam em um mundo de tanta fabulação trouxa.