Existem pessoas que sofrem de cleptomania, impulso incontrolável que leva alguém a furtar, não se importando com o valor da coisa.
Algumas ficam nervosas durante a prática do crime e se caracterizam por defecar no local. Lembro de um furto ocorrido no Grupo Escolar onde estudei e que fizeram o “serviço” sobre a mesa da diretora. Em outro caso célebre, um policial, revoltado pela excessiva bondade do Juiz com os ladrões, teria indicado a casa do magistrado a um deles.
Em determinado comarca em que atuei, a prática do furto era uma característica já familiar pois os três irmãos eram dados à “atividade”. Interessante que praticavam os furtos à luz do dia, desfilando pelas ruas com os objetos furtados, tornando mais fácil o trabalho policial. Cheguei à conclusão que intimamente desejavam retornar à prisão, pois era o ambiente que conheciam e onde se encontravam todos os seus amigos. Sua personalidade exigia uma rotina e controle que não encontravam na vida em liberdade, onde deveriam decidir por si próprios e buscar a sobrevivência econômica.
A falta de uma formação profissional e a possibilidade de conseguir um trabalho digno, aliado à deformação da personalidade, levava outro à praticar pequenos furtos. Meus conselhos pouco adiantavam e já chegava à sala de audiências pedindo desculpas pela prática de mais um delito. Tinha mulher e filhos o que era desculpa para sua conduta. Não era perigoso, mas não se controlava perante uma oportunidade de furtar.
Numa ocasião entrou na residência de um conhecido empresário da cidade, enquanto este e o filho dormiam. Desligou silenciosamente os cabos e se preparava para sair com o televisor quando avistou a adega envidraçada. Nela havia garrafas de vinhos e litros de whisky importados. Nunca havia experimentado algo assim e não pôde resistir, deslumbrado pelos rótulos coloridos em língua estrangeira. Experimentou um, depois outro e foi seguindo a degustação…
Depois de algum tempo e quase uma dúzia de goles, sua coordenação motora já não estava perfeita. Foi inevitável fazer barulho com as garrafas e copos de cristal do empresário que acordou-se e foi até a sala, armado com seu revólver, flagrando o invasor.
A ordem para levantar os braços e permanecer imóvel soou pela casa, acordando o menino, filho do conhecido empresário. Este correu para a sala e deparou-se com o pai apontando o revólver para o ladrão que cambaleava por efeito da fina bebida.
Apavorado o filho grita:
– Não atira pai. É o fulano que lava sempre o nosso carro.
O empresário conteve-se e ligou para a polícia, mantendo o invasor sob a mira do revólver.
Quando a viatura policial aproximou-se, com a sirene ligada, o ladrão desesperou-se e correu para a sacada, que felizmente não era alta, saltando e desaparecendo na escuridão.
Em outra ocasião o mesmo agente ingressou num hotel da cidade e furtou o rádio de um hóspede. Na época não havia televisor nos apartamentos e nem se ouvia falar em aparelho celular. Ou se assistia o televisor coletivo no saguão ou ouvia-se rádio para inteirar-se das notícias políticas, futebol ou música.
Após praticar o furto do rádio e já preparando-se para sair, olhou para aquela belíssima cama, bem arrumada, com lençóis brancos e travesseiros macios, com o emblema do hotel, e não pôde resistir. Resolveu deitar-se naquela cama convidativa, pelos menos um pouco, porquanto nunca estivera hospedado em um hotel… Espreguiçou-se, estendeu as pernas e deixou-se relaxar naquela cama macia.
Não sabe quanto tempo se passou. Acordou-se sobressaltado com os gritos da polícia, do proprietário do hotel e do hóspede assustado que buscara ajuda ao flagrar o invasor em sua cama.
Mais uma vez acusado de tentativa de furto, inquérito e processo criminal, não pôde o juiz deixar de esboçar um sorriso ao interrogar mais uma vez o ladrão azarado…