Para quem não foi atingido pela tragédia das enchentes é muito difícil imaginar o que seja encontrar a casa onde se morava com a família destruída ou com todos os pertences inutilizados. É uma realidade cuja dor é impossível de mensurar. Toda uma vida desaparece, levada pela água, barro e lixo.
A paralisia consequente da visão do patrimônio construído por décadas num primeiro momento impede qualquer reação. Esta é uma impressão colhida a partir de um depoimento que ouvi em um armazém perto de casa, em Porto Alegre. O desabafo daquele homem atarracado, usando roupas simples e com linguajar direto, mexeu comigo.
– Depois de 25 dias com a água cobrindo tudo, finalmente a gente conseguiu entrar na casa. Ver o barro cobrindo tudo causou uma crise de choro na minha mulher e nas três filhas. Aí eu também não aguentei… Chorei o dia todo, sentado na calçada, sem força pra pegar uma enxada ou a mangueira pra começar a limpar o que sobrou– contou.
Mesmo que “cada um ganhe uma casinha” – conforme o presidente Lula prometeu nas quatro vezes em que esteve no Vale do Taquari – a memória afetiva e material dos atingidos jamais será recuperada.
A promessa de uma residência para todos flagelados jamais se concretizará, todos sabemos, mas a repetição machuca esta gente pobre e esperançosa. Faltam terrenos e vontade concreta. Sobram demagogia e promessas vãs.
Em outubro vamos escolher com critério aqueles
que irão nos representar. Sem demagogia ou ilusões
De setembro do ano passado até agora, nenhuma casa foi sequer iniciada por iniciativa das autoridades estaduais e federais.
Perder fotos, diplomas, brinquedos, roupas e lembranças dos filhos machuca o íntimo de pessoas obrigadas a peregrinar por abrigos ou na casa de familiares. Desde a tragédia eles perderam o direito à privacidade e de uma vida de hábitos simples. Como receber a visita de parentes e amigos e fazer um churrasco no domingo para contar as novidades, como as palavras que o nenê da casa aprendeu a pronunciar.
Começar do zero, para esta legião de sofredores, não é força de expressão. É o resumo desta realidade imposta pela força da natureza somada à incúria de autoridades. Logo eles… que pediram o voto, mas não cumpriram a palavra empenhada que está implícita no exercício do mandato popular.
É preciso, com urgência, reativar pequenos empreendimentos, motor da economia e responsável pela geração e manutenção de empregos. Esta mão de obra é que tem na rotina ir ao mercado, à loja de vestuário, revenda de veículo e de eletroeletrônico para substituir a tevê, geladeira, microondas e liquidificador.
Vamos rezar, cobrar e construir soluções. E em outubro, vamos votar com critério, seriedade e análise daqueles que devem nos representar. Sem demagogia.