A subida rápida do rio Taquari surpreendeu, o que ampliou consideravelmente os prejuízos. Moradores ribeirinhos que já passaram por várias enchentes consideram o desastre natural desta semana totalmente atípico. Tanto pela altura que o rio chegou, como pela velocidade que subiu. Imóveis nunca inundados tiveram água até o segundo pavimento. Muitas pessoas tiveram de ser resgatadas com barcos e até helicóptero.
Por todos os lados há relatos dos momentos de medo, angústia e pavor, vividos a partir da madrugada de terça-feira quando a água começou a subir de forma muito rápida. Muitos se abrigaram no pavimento superior, confiando estarem seguros e foram surpreendidos, precisando ser resgatados de barco. Enquanto outros ficaram por horas dentro da água ou em telhados.
Os envolvidos nos resgates relatam cenas de horror. Correnteza, pessoas desesperadas pedindo socorro, o acesso dificultado pela rede de energia, barcos virando… Um cenário assustador e que dificilmente vai ser apagado da memória de quem o viveu.
“Nunca vi algo igual, agora vamos seguir para reconstruir”
Orli Rodrigues, 66 anos, que reside no bairro Navegantes há mais de 50 foi uma das vítimas da enchente histórica que atingiu Arroio do Meio e o Vale do Taquari. O aposentado mora na rua Campos Sales, uma das mais atingidas pela força das águas, e diz que nunca havia presenciado situação semelhante na vida. “Já peguei muita enchente, mas como essa nunca vi igual, perdi muita coisa. Pensei que a de 2020 fosse a maior. Lembro os antigos falarem da de 1941 que também foi grande”.
Em meio a tantas perdas e tragédia, Rodrigues conseguiu salvar a calopsita Chico, uma de suas companheiras há oito anos. “Já é da casa e tive que salvar. Estamos vivos e com saúde, isso que importa. Agora vamos seguir para reconstruir tudo de novo”.
“Foi devastador”
O também morador da mesma rua e do mesmo bairro há 30 anos, Francisco Ferreira da Costa, 70 anos, conta que nunca vai esquecer a cena presenciada com a enchente. “No ano de 2020, foi feio, mas perdi muito pouco. Agora foi devastador e quase todos perderam tudo”. Ele a esposa perderam tudo que tinham na casa.
Fala que a velocidade do rio que invadia os cômodos foi algo impressionante. “A meia-noite de segunda para terça saímos de dentro da residência e a água já estava na janela. Tivemos que sair daqui pela sacada do vizinho em uma lancha, porque foi tudo muito rápido. Se não fôssemos logo, morreríamos dentro de casa. Realmente, eu não pensei que o Taquari subiria tanto, jamais imaginaria uma coisa dessas”. Costa também perdeu a criação de codornas e galinhas e a horta que cultivava variedades de plantas e temperos.
“Perdemos tudo”
Entre os atingidos pela enchente, dezenas de relatos de perdas e de solidariedade. É o caso dos pedreiros Renato Cardoso e Carlos Aberto Flores moradores do Centro, no local conhecido como Maracangalha. Os dois estavam numa obra em Cachoeira do Sul e voltaram às pressas para Arroio do Meio. Eram 20h de segunda-feira quando voltaram para casa, mas já era tarde, pois a água subiu repentinamente. Renato perdeu o carro que utilizava para o trabalho, televisor, eletrodomésticos novos, móveis e roupas. Ele estava no imóvel há seis meses. Antes disso morava no Glória, mas em decorrência do aluguel caro, optou pelo imóvel na área central. As perdas ultrapassam R$ 30 mil. Carlos Aberto conseguiu recuperar mais bens. Ambos seguiram ajudando outros vizinhos na mesma situação com auxílio de caícos. A solidariedade era o que restava a ser feito. “Ainda não caiu a ficha”. Agora os colegas de trabalho estão momentaneamente abrigados no Clube Sete de Setembro.
Assustador
Dirceu Luís de Brito mora na rua Campos Sales, no bairro Navegante há 30 anos. Esta foi a terceira enchente que viveu desde então. Certamente a maior e mais assustadora. Com o rio subindo, a família foi se abrigando no segundo pavimento da casa. Não foi o suficiente, a água invadiu, obrigando a família a deixar o imóvel de barco. Na quarta-feira, enquanto tirava a lama e avaliava os estragos, Brito contou que nunca tinha visto nada igual. A força da água deslocou a casa do vizinho para o meio da rua. Lamentava pelas perdas materiais, mas agradecia por todos estarem vivos.
Gratidão pela vida
A casa de Rosani e Nei Gomes da Silva, no Navegantes, também foi tomada pela água, que chegou no segundo pavimento. Na quarta-feira, enquanto limpava, Rosani sorria e não deixava se abater. Dizia que por mais que dói perder tudo o que tinha dentro de casa, bens, documentos e até suas flores que tanto amava, sentia gratidão porque todos estavam bem. Além disso, a casa permaneceu intacta, enquanto outras se foram rio abaixo. “Vamos tocar em frente, as coisas se compra de novo”.